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Atitudes administrativas contemporâneas

ARTIGOS

Atitudes administrativas contemporâneas

Richard Gonzalez

Professor-Assistente, Departamento de Administração de Pessoal e da Produção, «Michigan State University»

Qualquer que seja a cultura em que se encontre, o administrador reconhece como universais certas atitudes que o identificam, na comunidade sociale econômica.

É finalidade dêste artigo indicar que, além da importância tradicional que se dá às questões filosóficas e científicas relativas ao estudo da administração e dos processos administrativos, existe evidência empírica de que os administradores modernos de qualquer cultura observam situações semelhantes de modo uniforme. Cada administrador tem que adotar certas atitudes para orientar suas decisões. Estas atitudes podem representar ou uma visão pessoal dos fatos, ou a natureza da adaptação que o administrador faz a êsses fatos. Não obstante, o administrador as verbaliza e a identificação das mesmas deveria, portanto, constituir um primeiro passo para a compreensão da ação administrativa.

Esta premissa é verificada em duas novas direções que o estudo da administração está tomando. A primeira é bem representada pelo trabalho de HARBISON e MYERS, intitulado "Management in the Industrial World"(1 (1 ) F. W. Harbison and Myers, Management in the Industrial World, An International Analysis, McGraw-Hill Book Company, New York, 1960. ). Êstes autores declaram que, em tôdas as sociedades industrializadas, o elemento ativo e crucial, no processo da industrialização, é o grupo de profissionais administrativos. Qualquer que seja o contexto cultural, político ou ético dentro do qual operem os vários grupos de administração, suas funções e atividades são consideràvelmente semelhantes.

Para o estudioso, êste ponto de vista representa o desenvolvimento de uma compreensão da administração como função verdadeiramente universal, na sociedade moderna. Há, aqui, um conflito com o método convencional ou clássico, que considera que os princípios ou "provérbios" de administração fazem parte da experiência obtida dentro de um determinado ambiente político, social ou ético.

Outra nova direção é dada pelo trabalho feito por economistas, que estão desenvolvendo uma teoria de crescimento econômico em que a administração é considerada pré-requisito necessário ao estabelecimento de uma industrialização auto-suficiente(2 (2 ) Vide, por exemplo, W.W. Rostow, The Stages of Economic Growth, The Cambridge Univ. Press, Cambridge, Mass., 1957. ).

Estas duas tendências - a primeira uma compreensão da semelhança da função administrativa nas sociedades modernas e a segunda o reconhecimento da importância do grupo administrativo profissional como condição necessária para o estabelecimento de altos níveis de industrialização - servem de base para a discussão das atitudes que passamos a examinar.

Primazia e Impessoalidade da Organização

Os administradores contemporâneos são guiados pela crença de que a dimensão mais importante do empreendimento industrial é a organização. Grande energia é despendida para projetar, aperfeiçoar e manter a estrutura da organização. O administrador reconhece que a complexidade da sociedade industrial contemporânea requer a combinação eficiente de uma variedade de talentos humanos especializados. O meio de conseguir essa eficiência é a organização. Sua estrutura é concebida como se a contribuição econômica do membro humano estivesse separada da personalidade do indivíduo. Êste é, então, subordinado à organização, que exige dêle obediência e submissão aos seus regulamentos e insiste na lealdade em relação aos seus objetivos. A fim de manter a organização, o desempenho do indivíduo é especificado, regulado e sujeito a revisão. A existência da organização é tida como independente e superior à dos indivíduos que para ela trabalham.

Apesar da consideração que se tem dado ao conflito entre personalidade e organização(3 (3 ) Vide Chris Argyris, Personality and Organization, Harper and Brothers, New York. Vide também Perrin Stryker, The Men from the Boys, Harper and Brothers, New York. ), as vantagens da divisão eespecialização do trabalho impuseram ao administrador a tarefa de aplicar, de maneira uniforme e consistente, as regras e regulamentos da organização e de selecionar e avaliar as personalidades com base na contribuição técnica que possam dar para preencher as necessidades da mesma. É evidenteque alguns indivíduos adquirem segurança ao saber exatamente o que se espera dêles e ao verificar que a avaliação de seus esforços será feita de acordo com critérios preestabelecidos. Outros, entretanto, ressentem as limitações destasituação.

O administrador moderno sabe que deve prover incentivos, prêmios e satisfações para compensar estas condições de "despersonalização". Reconhece, também, que o estudo das relações humanas está voltado para a solução dêste conflito "personalidade-organização". Apesar dêstes problemas, a administração moderna está ciente de que não há possibilidade de voltar à antiga atitude "paternalista", que fazia das diferenças individuais a base da administração(4 (4 ) Vide Harbison & Myers, op. cit., para uma discussão da base «paternalista» da administração industrial. Já se reconheceu que as mudanças eventuais numa sociedade, que se refletem nos parâmetros políticos e legais impostos à empresa, impedem os padrões de «paternalismo» da administração. ).

Profissionalismo

Nos escritos de certos economistas clássicos, havia a advertência de que o administrador assalariado não seria capaz decuidar dos melhores interêsses do proprietário do negócio. O nepotismo era, logicamente, o meio de garantir a continuidade de existência à emprêsa(5 (5 ) Harbison & Myers demonstram que o nepotismo foi mais evidente no desenvolvimento industrial do Japão, embora o crescimento exigisse a contratação de administradores profissionais estranhos às famílias tradicionais de proprietários. Vide Crawford Greenowalt, The Uncommon Man, McGraw-Hill Book Co., New York. Greenewalt afirma que o treinamento e desenvolvimento de administradores de cúpula podem ser melhor realizados no próprio trabalho. ). Sendo a administração hereditária, acreditava-se que não era possível adquirir conhecimentos administrativos a não ser na própria emprêsa. Além disto, o administrador assalariado não podia ir além de certo nível, na organização.

A ampliação da atividade industrial, o crescimento das empresas e as complexidades que daí resultaram para a administração acabaram por tornar obsoletas estas crenças. Os administradores contemporâneos afirmam que a administração não é uma arte intuitiva e que há técnicas, práticas e habilidades que podem ser aprendidas através de treinamento formal. Daí resultou o desenvolvimento de pesquisa e recursos educacionais destinados ao estudo e ensino da administração.

A estrutura da sociedade moderna colocou um grande podernas mãos do administrador profissional e êste tem reagido à altura da responsabilidade. Êle responde às exigências da organização de uma forma que o leigo não compreende. Assim como acontece em outras profissões, o administrador industrial desenvolve um código de comportamento. Êle é tècnicamente competente e se submete a uma avaliação quetem por base essa competência. Em outras palavras, é um profissional de carreira.

Há, ainda, outra atitude a considerar, neste particular: aquela que indica que o administrador contemporâneo encara sua função como a de um "esta dista" de negócios, com obrigações não apenas em relação a proprietários, mas também a trabalhadores, fregueses, fornecedores e à comunidade em geral(6 (6 ) É interessante notar que Crawford Greenewalt (op. cit.) e A. A. Berle, The 20th. Century Capitalist Revolution, Harcourt Brace and Company, New York, têm opiniões divergentes quanto à consciência social do administrador de emprêsas. ). Não importa que, até certo ponto, esta atitude possa ter sido imposta à administração. O fato é que, devido ao reconhecimento da sua função de prestar serviços, a administração moderna parece estar respondendo de forma construtiva ao tremendo poder econômico que lhe foi confiado. O impacto dessa atitude provocou uma mudança de foco por parte da administração: ao invés de lucros imediatos e a curto prazo, consideram-se agora os benefícios econômicos e sociais a longo prazo.

Contrôle Administrativo

Talvez nenhum outro têrmo tenha tantas implicações, no pensamento administrativo moderno, quanto "contrôle". Contrôle significa a determinação, por parte da administração, de conduzir ativamente a emprêsa em direção a objetivos definidos. Há a crença de que tal atividade não constitui uma simples reação a um sem número de imponderáveis e acontecimentos fortuitos sôbre os quais a administração não tem nenhuma influência. No conceito clássico de concorrência, talvez êsse fôsse o caso. Com o avanço do conhecimento e o desenvolvimento de técnicas de análise, a administração encontra-se em posição de estabelecer objetivos, especificar planos, avaliar o desempenho e, se necessário, agir de forma corretiva - controlar.

Ainda aqui, não importa que condições da atividade industrial moderna possam compelir a administração a adotar esta modificação. Há pouco lugar para êrro, no mundo empresarial de hoje. Ademais, no estado atual da tecnologia, a administração deve encarregar-se de um grande número de obrigações para um período futuro muito extenso. Assim, há a tendência, cada vez maior, de realizar pesquisas, previsões e planos sofisticados. O uso de planejamento tem provocado a crítica de que a administração tende a tornar-se inflexível e rígida. A atitude, entretanto, prevalece e realça a necessidade de se conhecer e avaliar objetivamente as conquistas da emprêsa. Por estas razões, a administração da firma moderna dá ênfase aos vários sistemas destinados a fornecer-lhe comunicações e informações. Como condição necessária para o sucesso da realização econômica, a tendência, sem dúvida, continuará, através do aumento da procurade informações e da apreciação objetiva do desempenho à luz de planos e programas preestabelecidos.

Crescimento e Inovação

Entre os administradores contemporâneos, há a crença generalizada de que o crescimento é condição necessária à sobrevivência industrial. Se a tecnologia de hoje impõe esta condição ou se a mesma é uma simples resposta aos fatos da vida político-demográfica, é outra questão. Como atitude, entretanto, é um axioma da administração. O crescimento é vistocomo uma evidência inquestionável de acêrto na conduta empresarial.

Esta atitude de crescimento não é expressa apenas em têrmosde tamanho de fábrica ou volume de vendas. É mais uma atitude de dinamismo - extensão de atividades, entrada em novos mercados, expansão de linhas de produto, obtenção denovos canais de distribuição, estabelecimento de armazéns ou aperfeiçoamento do arranjo físico. Duas das expressões mais em voga, nesta atitude, são diversificação e consolidação.

A diversificação pode ser o resultado da tentativa de eliminar riscos e perdas. Mas pode, também resultar da expansão das operações e do volume de vendas da emprêsa, com o fito de aumentar os lucros. A diversificação pode surgir da pesquisa de produto ou da necessidade de empregar mais plenamente a capacidade da emprêsa. Pode destinar-se a remover influências cíclicas da procura, ou a aproveitar novos mercados.

A consolidação envolve, comumente, a compra de outras emprêsas ou fábricas, ou a obtenção de seu uso e controle através da compra de um certo número de ações. A consolidação pode ser feita por várias razões, mas seu maior objetivo tanto pode ser a diversificação, como uma melhoria deposição no mercado.

Talvez a consideração pelo crescimento reflita simplesmente a certeza de que a emprêsa comercial é dinâmica. O administrador moderno não crê que as organizações devam permanecer imutáveis, que os mercados possam estagnar-se ou que não haja possibilidade de empregar, com proveito, novos métodos ou processos.

No passado recente, o administrador era um dos membros mais conservadores da comunidade. Hoje, isto mudou: devem ser adotados novos processos e novas técnicas, a fim de atender, com inovações e modificações de tôda a espécie, às exigências da comunidade. A inovação, também, significa que o administrador contemporâneo está empenhado em emprestar dinamismo a suas operações. A prova disto está no aumento de pesquisa básica e aplicada que a administração vem fazendo e nas horas incontáveis que os administradores vêm despendendo em programas de educação e treinamento.

Conclusões

Esta exposição não representa uma relação completa das atitudes contemporâneas da administração empresarial. O têrmo "contemporâneo" foi selecionado para indicar que há ações, funções e atitudes administrativas que são aplicáveis a qualquer sociedade industrial moderna.

Poder-se-ia perguntar se existem estas mesmas atitudes, nos países economicamente sub ou semidesenvolvidos. Com o desenvolvimento da tecnologia e da organização industrial, pode-se prever que, também nesses países, estas atitudes tornar-se-ão cada vez mais importantes.

Uma das mais importantes realizações humanas é, sem dúvida, a administração. A necessidade de capacidade técnica e administrativa tem sido reconhecida, no Brasil e em outras economias em desenvolvimento, como se pode verificar nos esforços que estas nações estão fazendo para criar escolas de administração de emprêsas e adotar programas de ensino e aperfeiçoamento dessas capacidades. A eficiência do ensino depende, entretanto, de familiarizar o estudante com as atitudes e disposições dos administradores, pois estas influenciam tôdas as decisões que tomam.

  • 1
    (1) F. W. Harbison and Myers, Management in the Industrial World, An International Analysis, McGraw-Hill Book Company, New York, 1960.
  • 2
    (2) Vide, por exemplo, W.W. Rostow, The Stages of Economic Growth, The Cambridge Univ. Press, Cambridge, Mass., 1957.
  • 3
    (3) Vide Chris Argyris, Personality and Organization, Harper and Brothers, New York.
  • Vide também Perrin Stryker, The Men from the Boys, Harper and Brothers, New York.
  • 5
    (5) Harbison & Myers demonstram que o nepotismo foi mais evidente no desenvolvimento industrial do Japão, embora o crescimento exigisse a contratação de administradores profissionais estranhos às famílias tradicionais de proprietários. Vide Crawford Greenowalt, The Uncommon Man, McGraw-Hill Book Co., New York.
  • (1
    ) F. W. Harbison and Myers, Management in the Industrial World, An International Analysis, McGraw-Hill Book Company, New York, 1960.
  • (2
    ) Vide, por exemplo, W.W. Rostow, The Stages of Economic Growth, The Cambridge Univ. Press, Cambridge, Mass., 1957.
  • (3
    ) Vide Chris Argyris, Personality and Organization, Harper and Brothers, New York. Vide também Perrin Stryker, The Men from the Boys, Harper and Brothers, New York.
  • (4
    ) Vide Harbison & Myers, op. cit., para uma discussão da base «paternalista» da administração industrial. Já se reconheceu que as mudanças eventuais numa sociedade, que se refletem nos parâmetros políticos e legais impostos à empresa, impedem os padrões de «paternalismo» da administração.
  • (5
    ) Harbison & Myers demonstram que o nepotismo foi mais evidente no desenvolvimento industrial do Japão, embora o crescimento exigisse a contratação de administradores profissionais estranhos às famílias tradicionais de proprietários. Vide Crawford Greenowalt, The Uncommon Man, McGraw-Hill Book Co., New York. Greenewalt afirma que o treinamento e desenvolvimento de administradores de cúpula podem ser melhor realizados no próprio trabalho.
  • (6
    ) É interessante notar que Crawford Greenewalt (op. cit.) e A. A. Berle, The 20th. Century Capitalist Revolution, Harcourt Brace and Company, New York, têm opiniões divergentes quanto à consciência social do administrador de emprêsas.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Jul 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 1961
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