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Uma era de descontinuidade: orientações para uma sociedade em mudança

RESENHA BIBLIOGRÁFICA

Antonio Celso Agune

Uma era de descontinuidade: orientações para uma sociedade em mudança

Por Peter F. Drucker. 3.ed. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1976. 427 p.

Trata-se da tradução feita por J. R. Brandão Azevedo da 1.a edição do livro, publicada em 1969 por William Heinemann Ltd. de Londres e por Hopper & Row (Publishers) Inc. de Nova York, cujo título original é: The age of discontinuity: guidelines to our changing society.

Escrito em estilo de reportagem em face da abordagem dada - superficial segundo o próprio autor - é dividido em quatro partes principais, e procura, em linhas gerais, diagnosticar e descrever o período de transição (descontinuidade) por que estamos passando, concentrando suas atenções, principalmente, em quatro níveis: novas tecnologias, mudanças estruturais na economia mundial, estrutura da sociedade e no conhecimento científico.

Devido ao caráter superficial do livro, torna-se bastante difícil uma análise mais concreta nesta resenha, já que são abordados inúmeros problemas sem uma seqüência ou ligação claramente definida. Em virtude desta razão irei, simplesmente, descrever alguns tópicos, que considero mais relevantes, dentro de cada capítulo do livro.

Na primeira parte - As tecnologias do conhecimento (p. 15-94), considerando que "... na área em que a maioria das pessoas pensa que se deram as maiores mudanças nos últimos 50 anos foi na verdade, um período de continuidade espantosa e inigualada: a economia", o autor procura demonstrar que as indústrias modernas que mais contribuíram para o grande progresso econômico - a agricultura, o aço e a indústria automobilística - estão baseadas em invenções ou descobertas datadas de, aproximadamente, 50 anos, não sendo portanto tão "modernas" quanto se afirma. Também, não têm mais condições de permitir um crescimento satisfatório - tanto nos países desenvolvidos como nos em desenvolvimento - originando-se então um período de transição ou descontinuidade previsto pelo autor. Para que a economia entre, novamente, numa época de crescimento prolongado (continuidade) o autor acredita que quatro indústrias - a de informações, a de materiais sintéticos, as derivadas dos serviços necessários às megalópoles e à exploração de oceanos - terão papéis de base ou sustentação no processo, só que, será necessário um novo conhecimento científico e tecnológico, uma nova mentalidade empresarial e uma nova estrutura organizacional para se adaptar a essas mudanças.

Na segunda parte do livro - Da economia internacional para a economia mundial (p. 95-196) - com subtítulos "proféticos" como Tornando o pobre produtivo, O que não funcionará, etc, procura demonstrar que, na realidade, não existe mais uma economia nacional e sim uma economia mundial. Segundo o autor"... uma economia é, antes de mais nada, determinada pela demanda. Hoje o mundo inteiro, qualquer que seja sua verdadeira condição econômica, tem uma lista de demandas comuns, um conjunto comum de valores e preferências" (p. 98), o que determina o caráter mundial da economia atual. Para esta nova economia, cuja empresa multinacional é a expressão mais fiel, tornam-se necessários a criação de uma nova teoria econômica, novas instituições mundiais, e, principalmente, um sistema monetário fortalecido, já que, segundo Drucker, sem isso não haverá condições para um crescimento econômico mundial prolongado.

Destina, ainda, parte deste capítulo para criticar a abordagem e métodos utilizados pela teoria econômica atual, e afirma ironicamente que "nenhum economista americano supera Milton Friedman na reunião de dados monetários. Nenhum pode sobrepujá-lo como analista econômico de talento. Friedman, a despeito de sua fama de grande conservador não está, em outras palavras, voltando à época anterior à nova economia. Está ultrapassando-a" (p. 193). Para o autor o estágio atual da teoria econômica está longe de ser o adequado à situação vigente, e é praticamente inconsistente com uma nova era de continuidade.

Na terceira parte da obra - Uma sociedade de organizações (p. 197-296) - afirma que, atualmente, o poder e a autoridade não estão mais nas mãos de uma única organização - o Estado - mas sim de várias. "A teoria social, para ter sentido deve partir da realidade de um pluralismo de instituições - uma galáxia (de estrelas) e não um grande centro rodeado de satélites que só brilham pelo reflexo da luz" (p. 202). Com esta frase o autor ilustra a decadência ou enfraquecimento do poder e prestígio estatal, quando comparado com o período logo após a Grande Depressão, onde o mesmo era visto como um salvador para os problemas da época. Destinamos parte deste capítulo para propor novas linhas de análise para as organizações onde, a premissa principal seria a determinação dos objetivos e responsabilidades sociais de cada empresa ou organização. Preocupa-se ainda no tópico Enfermidade do governo (p. 242-74), em diagnosticar as causas do acentuado declínio do prestígio do governo como instituição. Finalmente nesta terceira parte do livro Drucker indaga "como pode um indivíduo sobreviver?" (p. 275-94) e, em breves pinceladas, discute o problema dos estudantes na sociedade pluralista.

Na quarta e última parte: A sociedade do conhecimento (p. 297-424) levanta as bases necessárias e as possíveis conseqüências da forma de trabalho estruturada no conhecimento. Discute também como deveria ser a nova estrutura do sistema educacional e suas Influências e repercussões sobre as características individuais, principalmente sobre a habilidade, e sobre a sociedade como um todo. Outra discussão interessante neste capítulo refere-se à relação da extensão dos anos de escola com a expectativa de vida útil. Coloca, o primeiro fato como efeito e não causa, concluindo, embora não de maneira satisfatória, que esta extensão nos anos de educação escolar força a criação de empregos que apliquem o conhecimento do trabalho. Esta relação de causa e efeito merece um estudo mais aprofundado para se chegar a uma conclusão.

A parte final deste livro, com o título de Conclusão, que ocupa algumas linhas a mais que uma folha, assume mais a forma de uma advertência quanto ao futuro do que propriamente um "fecho" nas idéias apresentadas ao longo da obra. Como podemos observar no trecho a seguir, "se essa descrição de nossa sociedade em mudança estiver certa, é improvável que as tendências dos últimos 60 anos dominem o restante do século, como supõe a maioria das previsões do 'ano 2000'. Em vez disso podemos esperar o surgimento de tendências novas e diferentes e preocupações novas e diferentes que exigirão nossa atenção" (p. 425).

Em nossa opinião a obra, apesar de uma análise muito superficial dos problemas levantados, apresenta várias idéias interessantes que poderão ser utilizadas, como ponto de partida ou sugestões, para novos estudos mais profundos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Ago 2013
  • Data do Fascículo
    Abr 1977
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