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Financiamento à habitação e distribuição de riqueza no Brasil

ARTIGOS

Financiamento à habitação e distribuição de riqueza no Brasil* * Este artigo é baseado num trabalho intitulado "Housing finance in Brazil: towards a new distribution of wealth", que saiu publicado em Urbanization and inequality: the political economy of urban and rural development in Latin America, v. 5 da série "Latin American Urban Research", editado por Wayne A.. Cornelius e Feiicity M. Trueblood (Beverly Hills, Londres, Sage Publications, 1975), p. 147-74.

Clark W. ReynoldsI; Robert T. CarpenterII

IPh. D. em economia pela Universidade da California, Berkeley, e professor de economia do Food Research Institute da Universidade de Stanford, California

IIMaster em Estudos Latino-Americanos da Universidade de Stanford, California, e assessor administrativo do Centro de Estudos Latino-Americanos da mesma universidade

1. INTRODUÇÃO

Analisaremos neste trabalho as realizações do SFH (Sistema Financeiro da Habitação) do Brasil, a partir do início da década de 70, e sua influência na distribuição da riqueza no país. Muitos dos fenômenos comumente associados com a urbanização da América Latina, como, por exemplo, a migração das zonas rurais para as urbanas, o crescimento explosivo da população urbana, a rápida expansão da infra-estrutura urbana e a especulação imobiliária contribuem para as transferências de riqueza sob a forma de haveres reais e financeiros, entre os diversos grupos da população. Freqüentemente essas transferências conduzem a uma crescente concentração da riqueza. Examinaremos, portanto, o fluxo de fundos através do SFH, a fim de determinar qual o impacto que as conseqüentes transferências de bens têm produzido sobre os padrões de distribuição de riqueza.1 1 Reynolds, Clark W. The use of flow of funds analysis in the study of Latin American capital market development. International Review of the History of Banking, Institut International D'Histoire de la Banque, n. 9,1974. (Revue International d'Histoire de la Banque). A inovação motodológica adotada no presente estudo é a aplicação de análise de fontes e uso de fundos (fluxo de fundos) ao estudo de um principal subsetor de intermediação financeira no processo de desenvolvimento. O estudo é destinado a determinar, mediante a associação dos fluxos financeiros com as principais atividades e respectivos grupos de rendas, qual a incidência da política de financiamento de habitação na configuração da alocação de recursos e da distribuição de riqueza. Dessa forma, ele faz parte de um programa mais generalizado de pesquisa por parte dos autores sobre as interações entre os setores real e financeiro no processo de desenvolvimento, sua relação com a política financeira e as implicações de crescimento e bem-estar.

Uma das principais hipóteses admitidas no estudo é a de que a intermediação financeira pode ser utilizada para conjugar as poupanças voluntárias e involuntárias com os empréstimos parcialmente subsidiados, a fim de se efetuarem modificações na configuração de posse de ativos reais, sem distorções de vulto na eficiência da alocação de recursos. Essa abordagem implica um reconhecimento do papel quase fiscal da política da intermediação financeira, conforme funciona em muitos países em vias de desenvolvimento. A abordagem adotada no Brasil em relação ao financiamento da construção residencial constitui fundamentalmente uma variação de estratégias anteriores, geralmente menos bem sucedidas, utilizadas em outros países da América Latina. A escassez de recursos para investimentos públicos nas economias em vias de desenvolvimento indica que os programas de construção de habitações com subsídios que abranjam a totalidade do custo estão fora de cogitação. Desta forma, diversos países da América Latina verificaram a necessidade de se estruturarem sistemas de captação de poupanças capazes de ser subseqüentemente utilizadas para complementar os subsídios governamentais.

A maior parte dos recursos do sistema brasileiro tem sido captada de duas maneiras diferentes, quais sejam, mediante cadernetas de poupança, e mediante o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). Ambas essas fontes de recursos têm participação expressiva das classes operárias, embora uma participação cujo grau relativo ao de outras classes ainda falte ser aferido com precisão. É claro, contudo, que os fundos captados pela outra fonte financeira significante do sistema - as letras imobiliárias - só provêm dos grupos de rendas mais elevadas, considerando que os preços de emissão dessas situam-se fora do alcance das classes trabalhadoras.

No que diz respeito ao efeito das fontes dos fundos sobre a distribuição da riqueza, será nossa finalidade estabelecer, na medida possível, o grau em que os diversos grupos de renda estão realmente financiando os programas de construção de habitações no Brasil, através dos mecanismos aqui citados. A devida avaliação das implicações da situação no que tange ao bem-estar do povo deverá evidentemente levar em consideração o retorno aos possuidores dos referidos ativos financeiros, sob a forma de juros e correção monetária.

Uma vez tratada a questão da identificação dos grupos de rendas, que constituem os principais elementos de suprimento de recursos ao SFH, passaremos a considerar um aspecto mais difícil do problema de transferência de riquezas, qual seja: quais os grupos que estão realmente recebendo subsídios de ativos via pagamentos efetuados pelo SFH? Boa parte da falta de precisão nossa na identificação dos beneficiários dos referidos pagamentos provém do fato de que os programas da habitação vêm sendo conceituados cada vez mais pelas autoridades governamentais, não como um problema à parte, mas como apenas uma faceta de um conjunto integrado de problemas urbanos. Conseqüentemente, os recursos vêm sendo alocados, de modo crescente, para projetos comunitários de infra-estrutura em que são incluídas habitações além de outros elementos. Esse tipo de investimento não facilita a tarefa de identificação dos grupos de renda que mais se beneficiam de sua execução.

Quanto às operações financeiras que podem ser facilmente classificadas pelo nível de renda, mormente o próprio financiamento de habitações, consideração importante relacionada com os padrões de distribuição de riqueza é a escala de taxas dè juros nos empréstimos provenientes do SFH, que varia de forma positiva, em conformidade com o nível de renda auferida. É bem verdade que a aplicação da correção monetária destina-se a evitar a incidência de taxas de juros negativas, tão comuns nas operações financeiras a longo prazo nas economias latino-americanas flageladas pela inflação nas décadas recentes. Verifica-se, contudo, que os mutuários das classes de rendas mais baixas no SFH gozam de um efetivo subsídio às custas dos que pagam taxas de juros mais elevadas.

Para se verificar se existe algum elemento de subsídio, mesmo que em relação às taxas mais altas, também, seria preciso fazer uma comparação com as taxas de juros prevalecentes no mercado imobiliário tradicional. A aplicação da estrutura de taxas de juros para criar subsídios parciais em benefício das famílias de rendas baixas torna mais complicada qualquer avaliação da distribuição de habitações com financiamento do SFH, de acordo cóm os níveis de renda. Os dirigentes deste sistema argumentam, com certa consistência que a viabilidade das taxas diferenciais de juros depende da manutenção de um volume adequado "de financiamentos com elevadas taxas de juros á disposição das famílias de certo nível social alto.2 2 Veja. por exemplo. Banco Nacional da Habitação. Pronunciamento no Senado Federal: Mauricio Schulman (Comissão de Legislação Social. 16 set. 1975). Rio de Janeiro. Secretaria de Divulgação. 1975. p. 22. onde o presidente do BNH defendeu esse princípio face às críticas de alguns senadores da Oposição. Os dados disponíveis indicam ter ocorrido um considerável aumento na proporção dos fundos aplicados nesses financiamentos desde a inauguração do sistema.

A questão fundamental - em face de nossas investigações quanto aos grupos que vêm suprindo os recursos destinados às operações do SFH - consiste em se determinar qual a proporção ótima de empréstimos com altas taxas de juros relativa a empréstimos de todos os tipos, para a operação eficaz e equitativa do sistema. Seria possível determinar, subseqüentemente, se essa proporção tem ou não sido ultrapassada.

O presente estudo é parcialmente analítico, uma vez que o financiamento das habitações, apesar de seu papel importante na intermediação de economias voluntárias e contratuais para investimentos, é tratado independentemente do processo geral de desenvolvimento financeiro. É por esta razão que se dá pouca ênfase ao fato de que o financiamento da construção de habitações parece ter gerado distorções no processo de investimentos em construções residenciais urbanas (e em outras construções urbanas). Ademais, a escassez de dados impõe limites às possibilidades de mensurar com muita precisão a incidência do programa com base nos diversos grupos de renda. Espera-se, entretanto, que as observações apresentadas neste trabalho promoverão mais pesquisas referentes às conseqüências do financiamento da habitação no Brasil (no que tange tanto ao fator bem-estar social quanto ao fator distribuição da riqueza). Aliás, certos elementos do SFH já vêm sendo analisados sob essa ótica pela comunidade científica brasileira em anos recentes.3 3 Entre os melhores exempos desse tipo de abordagem analítica considera-se o trabalho FGTS: uma política de bem estar social. por Wanderley J. M. de Almeida e José Luiz Chautard, Rio de Janeiro, IPEA, 1967.

2. ANTECEDENTES HISTÓRICOS RECENTES

O SFH originou-se quando da fundação do BNH (Banco Nacional da Habitação), em agosto de 1964, logo após a deposição do Presidente João Goulart. Esse novo programa foi concebido como parte de uma revisão geral do sistema financeiro, do qual participaram os ministros da Fazenda e do Planejamento, Octávio Gouvêa de Bulhões e Roberto de Oliveira Campos, respectivamente. Os sucessivos governos militares, durante esta última década, enfatizaram a remodelação e expansão do sistema financeiro, como elemento básico da estratégia de desenvolvimento econômico do Brasil, tendo sido reservado ao BNH, em todo o processo, um papel relevante. Essa altu prioridade é evidenciada pela gama c diversidade c atividade que o governo deixou ficar agrupadas sob o manto financeiro e administrativo do BNH.

A partir de suas origens como instituição responsável primordialmente pelo cquacionamento do perene problema da construção de habitações populares, o BNH tem evoluído a ponto dc se constituir numa superagência, cujos interesses abrangem um amplo espectro de assuntos urbanos, como. por exemplo, redes de esgotos c abastecimento de água. transportes cm massa, mercados imobiliários, equipamentos comunitários, indústria de construção, fornecimento dc materiais dc construção e adestramento da mão-de-obra. Essa ampliação do âmbito dc ação do BNH se tem baseado cm parte não só no excesso de fundos para empréstimos estritamente para construção de habitações, mas também na percepção das inter-rei ações entre as diversas dimensões do ambiente urbano

As relações operacionais estabelecidas, contudo, tem sido de natureza predominantemente financeira. Assim, consideramos a política urbana no Brasil, conforme se acha explicitada nos programas do BNH, dirigida à captação de recursos financeiros para serem aplicados, se não no intuito de controlar o dinamismo do processo de urbanização, pelo menos no sentido de se explorar seu impulso para estimular o crescimento econômico. Além do mais, a ampla envergadura das operações financeiras do Banco proporciona-lhe um poder considerável, passível de influir ha maneira em que são distribuídos os frutos desse crescimento.

É com base nesse pano de fundo que nos propomos a examinar os componentes das operações do BNH abrangidos pelo SFH. Supõe-se que o sistema teria financiado mais de um milhão de habitações durante os primeiros 10 anos de sua existência, em contraste com a cifra de 120.000 unidades habitacionais financiadas através de entidades do poder público, durante os 25 anos precedentes.4 4 Banco Nacional da Habitação. BNH documenta. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. Contrasta-se à situação que existia na Colômbia, onde os instrumentos financeiros sujeitos à correção monetária (UPACs - Unidades de Poder Aquisitivo Constante) produziram distorções nos fluxos financeiros. O resultado foi uma proporção excessivamente elevada de investimentos nas residências urbanas, com relevantes conseqüências na distribuição da riqueza entre grupos de rendas diferentes, bem como na utilização da mão-de-obra nas zonas rurais e urbanas, e no crescimento do capital acionário em poder do público (capital stock). Isto assinala uma alteração dramática na configuração de aplicação de recursos. Nosso enfoque referente ao fluxo de fundos através do SFH mostrará como a mudança na alocação de recursos refletiu-se na configuração dos ativos e passivos financeiros.

3. CAPTAÇÃO DE POUPANÇAS: FONTES DE RECURSOS

Para compreender o efeito exercido pelo SFH sobre a posse de bens reais e financeiros, é imprescindível mencionar o mecanismo da correção monetária aplicado pelo governo a muitos aspectos do sistema financeiro, a partir de 1965, e que tem sido desde então firmemente defendido frente acrescente oposição No SFH, a correção monetária é efetuada mediante a reavaliação da UPC (unidade padrão de capital), em termos da qual são expressos os valores de todas as transações efetuadas no sistema. O valor da UPC é ajustado, trimestralmente, em conformidade com as reavaliações mensais do valor nominal das ORTNs (Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional).

Das numerosas distorções acarretadas pela grave inflação ocorrida no Brasil, no início da década de 60, aquela que preocupou sobremodo as autoridades governamentais foi o desaparecimento das aplicações no mercado habitacional, em face dos tetos impostos tanto aos aluguéis quanto aos juros de amortização habitacional. Estes desencorajavam respectivamente a demanda de investimentos na construção de habitações para locação e o suprimento de recursos a longo prazo para a comercialização de casas. Ao aplicar a correção monetária ao SFH, o governo procurou encorajar os investimentos relacionados com a construção de habitações. Uma vez que a correção monetária era aplicada também em outros setores do mercado de capitais, não se esperavahouvesse um vulto exagerado de desvios de fundos oriundos de outros setores.5 5 Hanson, J. Estimación de ahorro familiar en Colombia, mimeogr. As exceções dizem respeito às contas onde os depositantes não têm mudado de empresa desde antes da unificação da taxa de juros pela Lei n.º S70S, de 21 de setembro de 1971. Nesse caso específico, as contas fazem jus a incrementos periódicos da taxa de juros auferida, até um máximo de 6% depois do décimo ano, contanto que o depositante fique empregado pela mesma empresa. Um dos elementos essenciais dessa estratégia foi a introdução de novos instrumentos financeiros para captação dos recursos necessários às operações do sistema.

3.1 FGTS - Fundo de Garantia do Tempo de Serviço

Ainda na fase inicial, verificou o BNH que suas necessidades operacionais não vinham sendo acompanhadas com os fundos previstos na legislação original. Isto é, uma dotação orçamentária inicial de Cr$ 1 millhão, uma taxa de 1% sobre os salários de todos os trabalhadores cobertos pelas leis vigentes de indenização trabalhista e uma taxa de 4% dos aluguéis recebidos (pela qual os locadores receberiam letras imobiliárias resgatáveis após 20 anos). Nessa abordragem das dificuldades do BNH, o governo vislumbrava uma oportunidade de, simultaneamente, corrigir os defeitos da legislação de indenizações trabalhistas, então em vigor, e gerar recursos destinados ao novo programa. Como resultado criou-se, em setembro de 1966, o FGTS.

Para aqueles trabalhadores a serem abrangidos pelo fundo, e que optaram pelo mesmo, os empregadores são obrigados a depositar em contas pessoais do FGTS quantias correspondentes a 8% do seu salário no mês anterior. Para aqueles trabalhadores que não optaram pela cobertura do FGTS, os depósitos de 8% são mantidos numa conta em comum do FGTS.

Uma parte considerável dos referidos depósitos rende juros de 3% ao ano, além da correção monetária, conforme estabelece a Lei n.º 5.107, de 13 de setembro de 1966. Esses depósitos podem ser retirados por uma série de motivos, entre os quais a aposentadoria, demissão do emprego, término de um contrato temporário, grave enfermidade pessoal ou de pessoa da família do trabalhador, investimento inicial num empreendimento, ou aquisição de uma residência através do SFH.6 6 Banco Naciona da Habitação. Coordenação Geral do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Instruções sobre o FGTS. 4. ed. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. p.36-51.

Qual a importância do FGTS, fundo que representa a adoção de um único esquema de poupança compulsória por parte do governo, considerando-se os diversos objetivos de sua política? Verifica-se que a maioria dos trabalhadores urbanos optou pela cobertura do FGTS, que oferece maior proteção contra a inflação do que a garantia de indenização alternativa. As contas têm-se apresentado bastante ativas, com saques de aproximadamente 35 a 45% da arrecadação bruta em bases trimestrais, desde 1970.7 7 Banco Nacional da Habitação. BNH orçamento plurianual 1974 -1976. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. p. 83; Banco Central do Brasil. Boletim do Banco Central do Brasil; Brasília, 1974/1975. Esta cifra é baseada em uma representação do sistema financeiro brasileiro mais ampla do que aquela apresentada no quadro "Principais haveres financeiros - emissão do Sistema Financeiro e Tesouro Nacional, do Boletim do Banco Central. Com referência ao Relatório Anual 1974 do Banco Central, complementamos o quadro III.2 com dados referentes aos seguintes haveres financeiros: arrecadação líquida do FGTS (quadro III.24) e do PIS (quadro III.28), e as reservas das empresas seguradoras (quadro III.20). Levamos em consideração, também, o estoque de ações, o qual foi calculado da seguinte maneira: aproveitamos os dados para o valor nomimal a preços correntes do estoque de ações das empresas registradas na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro em fins de 1972, apresentados por Claudio R. Contador em seu livro Mercado de ativos financeiros no Brasil - perspectiva histórica e comportamento recente, tabela 3.5.,p. 105. A este saldo acrescentamos o valor nominal das ações emitidas durante 1973 (soma dos itens 9 e 38 no quadro IV.2 do Boletim). Assim, chegamos a um saldo total de haveres financeiros de Cr$ 260,5 bilhões, em fins de 1973, sendo o saldo de haveres financeiros não-monetários de apenas Cr$ 166,7 bilhões, estando as debêntures, neste caso, fora de consideração. As retiradas foram motivadas principalmente por aposentadoria, desemprego e doença. Até agora as retiradas associadas com investimentos (isto é, aquisição de moradia ou estabelecimento de empreendimentos comerciais independentes) têm representado um volume insignificante.

Contudo, a importância primordial do FGTS, do ponto de vista da dotação de recursos, reside na sua capacidade de colocar recursos à disposição do BNH. Não obstante a elevada taxa de retiradas, a expansão regular da força de trabalho urbana tem permitido ao fundo sustentar uma taxa salutar de crescimento, conforme é demonstrado na tabela 1. Pesquisas independentes realizadas pelos autores revelam que em 1972, o ano mais recente para o qual se dispõe de dados das contas nacionais, o aumento líquido dos recursos do FGTS atingiu pelo menos 1% do PIB (produto interno bruto). Além do mais, esse fundo, com um saldo de Cr$ 12,9 bilhões no final de 1973, representava 7,7% de todos os ativos não-monetários na economia (sendo 5,0% caso se incluam os ativos monetários).

Existe mais uma questão fundamental relativa ao FGTS, que é a seguinte: qual a participação relativa dos diferentes grupos de renda, no suprimento de recursos ao fundo? Isto tem importância não apenas para se determinar quais os grupos que estarão recebendo benefícios do tipo previdência social sob o fundo, ou que virão a recebê-lo, mas também para se verificar as origens socioeconómicas dos recursos que têm sido sustentáculo do SFH (diagrama fluxo de fundos no SFH - 1973). Os empregadores e trabalhadores autônomos são excluídos automaticamente da cobertura do FGTS, juntamente com os funcionários públicos e as pessoas incluídas em uma série de outros tipos de ocupações. Desta forma resta uma população assalariada equiparável ao universo de empregados em regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Dados referentes à distribuição de salários neste universo são publicados pelo Ministério do Trabalho.

Um estudo recente realizado pelos economistas Wanderley J. M. de Almeida e José Luiz Chautard sob os auspícios do Instituto de Planejamento Econômico e Social (IPEA) analisou essa distribuição com referência ao FGTS. Ao examinar as estimativas desses dois autores, pode-se determinar que pelo menos 40% do total de salários pagos a contribuintes do fundo nos anos 1970/73, pertenceu a trabalhadores auferindo menos do que três vezes o maior salário mínimo vigente no país,8 8 Almeida & Chautard, op. cit. acima nota 3, tabela A.6, p. 156-7. valor esse que constitui o teto para a discriminação que indicamos como sendo de 40,9% a parcela dos recursos destinados ao FGTS em 1973 provenientes das camadas de renda inferiores.

Convém frisar logo, entretando, que as condições instáveis prevalecentes na força de trabalho de baixa remuneração tendem a diminuir a participação relativa destes grupos no suprimento efetivo de recursos ao fundo, por duas razões: a) não há contribuições da parte de trabalhadores durante os período de desemprego; b) a incidência elevada de saques que caracteriza essa parcela da arrecadação do FGTS implica uma alta rotatividade dos respectivos recursos, que é incompatível com as necessidades financeiras do Banco Nacional da Habitação, órgão cujas aplicações mormente são de longo prazo. Essa alta freqüência de saques comprovou-se nitidamente quando Almeida e Chautard cotejaram as estimativas do BNH a respeito da distribuição de saques contra o FGTS por falta de renda no ano de 1973, com os dados do Ministério do Trabalho sobre a distribuição de salários no mesno ano: eles acharam que, enquanto os assalariados percebendo até três salários mínimos não foram responsáveis por mais do que 41% da arrecadação do fundo, eles participaram com 66% dos saques realizados naquele ano.9 9 Almeida & Chautard, op. cit. acima nota 3, tabela 11.7, p. 97, conforme o procedimento detalhado no subitem 3.1, na nota. Antes da unificação da taxa de juros sobre as Letras Imobiliárias em maio de 1974, essas taxas variavam de 6 a 8%. Por conseguinte há de se admitir que a participação proporcional efetivamente obtida pelos "grupos de baixa renda" da arrecadação devia ter ficado num valor aquém daquele indicado no diagrama. Por mais notável que tenha sido o crescimento do FGTS, esse fundo foi superado pelo desempenho dos instrumentos do SFH destinados à captação de poupanças voluntárias, conforme refletidas na última coluna da tabela 1. Isto é especialmente válido no que diz respeito às cadernetas de poupança nas Caixas Econômicas Federal e Estadual, APEs (Associações de poupança e empréstimos) e SCIs (sociedades de crédito imobiliário), que juntas compreendem o SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo).

Diagrama 1

Os saldos das cadernetas de poupança vêm crescendo mais rapidamente do que os de qualquer outro ativo financeiro no mercado. De um percentual de 2,6% do ativo financeiro total na economia brasileira, no final de 1970, a participação das cadernetas de poupança aumentou para 5,6% em fins de 1973, compreendendo 8,5% do total do ativo financeiro não-monetário. Este fator, juntamente com o FGTS e as letras imobiliárias emitidas pelas SCIs, fez com que estes três instrumentos do SFH representassem uma proporção elevada e crescente das fontes totais de recursos no Brasil, segundo a enumeração apresentada nos Boletins do Banco Central. Assim sendo, em fins de 1973, essa parte do passivo financeiro do SFH representava 13% do ativo financeiro total na economia brasileira, bem como 20% do ativo financeiro não-monetário. Isto serve para demonstrar, em parte, o formidável impacto econôrrüco-financeiro das iniciativas da política governamental no setor do desenvolvimento urbano.

Deve-se compreender que esses instrumentos de poupança voluntária têm, em relação ao SFH, uma significação bastante diferente da que possui o FGTS. Uma diferença fundamental reside nas camadas socioeconómicas donde provêm as respectivas poupanças. O exemplo mais nítido se verifica no caso das letras imobiliárias, que constituem instrumentos financeiros sofisticados. Há diversos tipos dessas letras as quais são diferenciadas pelo prazo e pela programação aplicada para se determinar a correção monetária e a taxa de juros, atualmente de 6% em todos os casos. Em face de suas denominações mínimas ou de Cr$ 1 mil ou de 20 UPCs (igual a Cr$ 1.780,00 ao valor médio da UPC em 1974), as letras imobiliárias ficam além das possibilidades financeiras das massas urbanas que ganham menos de três salários mínimos mensais (veja item 4 sobre distribuição das rendas urbanas).

Existe maior grau de identificação entre os depositantes em cadernetas de poupança e os contribuintes nas contas FGTS do que entre os investidores em letras imobiliárias e os contribuintes'do FGTS. Em fins de 1975 o número de contas da caderneta de poupança havia alcançado 9,9 milhões,10 10 Banco Central do Brasil. Relatório Anual 1975. Brasília, mar. 1976. quadro III. 12. ao passo que o total de contas FGTS chegou a 12 milhões, havendo alguma incidência de contas múltiplas no nome de um só depositante em ambos os casos. Existem fortes indicações no sentido de que a disparidade entre os dois totais verifica-se principalmente entre os assalariados de baixo nível de renda.

É bem verdade que os agentes do SBPE têm considerado o campo dos poupadores em potencial no Brasil como sendo um território quase inexplorado, que apresentava oportunidades atraentes à expansão. A década de 70 tem sido marcada por uma campanha de publicidade agressiva levada a cabo pelas APEs e SCIs - tanto individualmente como em colaboração com o Centro de Promoção de Poupança - nas principais cidades brasileiras, num esforço para persuadir as pessoas de rendas módicas a abrirem cadernetas de poupança. Essa campanha tem recebido substancial apoio logístico em virtude da proliferação das filiais dessas duas instituições, muitas vezes fora dos bairros nobres dos grandes centros urbanos, em forte contraste com a política pouco expansionista das Caixas Econômicas.11 11 Banco Nacional de Habitação. Superintendência de Agentes Financeiros. O Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo: Análise de 1972/1973. Rio de Janeiro, mar.1974. p. 36, 39.

Embora o esforço publicitário tenha influído no crescente influxo de recursos refletido na tabela 1. sem mencionar o crescente número de depositantes, que expandiu a uma taxa média anual de 53% entre 1970 e 1974. o seu êxito em trazer os pequenos poupadores ao sistema não pode ser avaliado com base nos dados disponíveis sobre flutuações dos saldos médios das contas com o passar do tempo. O saldo médio no SBPE, em geral, elevou-se de maneira uniforme de 1970 em diante, o mesmo ocorrendo com as contas das Caixas Econômicas, que não eram tão ativas em atrair novos depositantes como as outras duas instituições. Depois de sofrerem um declínio nos saldos médios das cadernetas em 1971, em face do boom verificado no mercado de ações, tanto as APEs como as SCIs experimentaram saldos médios crescentes nos três anos seguintes. Todavia, o saldo médio de depósitos de poupança nas Caixas Econômicas, em dezembro de 1975, ainda se encontrava bem acima da soma dos saldos médios das outras duas instituições.12 12 Banco Central do Brasil. Boletim do Banco Central do Brasil. Brasília v. 13, n.º 3, p. 126, mar.1977. quadro 1.34. O valor a ser utilizado para a coversão da UPC em cruzeiros deveria ser aquele em vigor durante o último trimestre do ano. Desta forma, para 1974 o valor operacional da UPC teria sido de Cr$ 101,90, estabelecendo-se assim um teto de depósitos beneficiáveis com a vantajosa dedução de 6% do imposto devido no nível de Cr$ 40.760,00 que, por sua vez, vem a ser mais de 11 vezes maior do que o saldo médio global no SBPE ao fim de 1974 -Cr$ 3.585,00.

Para se determinar se os crescentes saldos nas contas eram atribuíveis basicamente às rendas mais elevadas dos novos poupadores, ou meramente ao acúmulo de poupanças por parte dos antigos, seriam necessários dados mais pormenorizados do que aqueles disponíveis para a elaboração deste trabalho. O governo brasileiro está se empenhando em atrair os poupadores de rendas mais elevadas para as cadernetas de poupança. Quando da revisão de deduções de imposto de renda para os diversos tipos de investimentos em julho de 1974, as cadernetas de poupança receberam um tratamento mais favorável do que quaisquer outros ativos financeiros fora do mercado de ações. Embora o Decreto-lei n.º 1.338 estabelecesse um limite de saldo médio de depósito ao qual era aplicável a dedução mais vantajosa, ao nível de 400 UPC,13 13 Banco Central do Brasil. Relatório, Brasília, p. 113, 1974. O incentivo fiscal referente às cadernetas de poupança funciona como muitos dos outros elaborados pelo govemo brasileiro dentro do sistema financeiro do país, no sentido de conceder maiores benefícios às classes mais favorecidas. Além do fato de que as alíquotas progressivas servem para valorizar as deduções de acordo com a renda de uma pessoa que paga imposto de renda, deve-se lembrar que são apenas estas pessoas que podem ser beneficiadas. Para o ano-base de 1973, por exemplo, as pessoas cujas rendas anuais atingiam Cr$ 70.700,00 eram isentas de pagar imposto de renda; levando em consideração o décimo-terceiro salário, essa cifra anual representava uma renda mensal de 2,6 vezes o salário mínimo efetivamente aplicado nas capitais de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte durante 1973. Ademais, se forem levadas em consideração as deduções permitidas, era preciso ganhar Cr$ 13.000,00 anuais, no mínimo (o equivalente a 3,3 vezes o maior salário mínimo vigente no país), antes de dever o equivalente a Cr$ 100,00 em imposto de renda. esse teto se apresentava suficientemente elevado para que os depósitos futuros, atraídos pela vantagem fiscal, tendessem a elevar os saldos médios dos depósitos até uma cifra ainda mais alta do que a já atingida.

Caso as cadernetas de poupança sigam a configuração de comportamento previsto aqui, em respostas aos incentivos fiscais seletivos, será de se esperar uma divergência progressiva entre as proporções representadas pelas diferentes camadas de rendas, entre os titulares das contas vinculadas ao FGTS e os poupadores do SBPE. Isto é digno de nota não só em virtude das implicações quanto às perspectivas futuras de liquidez em cada instituição, em relação a futuras alterações na distribuição da renda no Brasil, mas também em virtude de os recursos que entram no SFH, mediante diferentes canais, tenderem a ser aplicados também de maneiras diferentes, conforme se depreende do diagrama. As ramificações de distribuição do processo serão consideradas quando se cogitar do tratamento dos empréstimos para construção de habitações efetuadas pelo sistema.

4. CANALIZAÇÃO DOS RECURSOS DISPONÍVEIS

Tendo examinado as origens dos recursos do SFH, procederemos agora aos destinos dos mesmos. Antes de iniciarmos uma discussão sobre as aplicações dos recursos sob a forma de empréstimos habitacionais, convém chamarmos a atenção para outra aplicação significativa desses fundos pelo BNH. pelo fato de se relacionar â nossa perspec tiva para com os aspectos redistributivos do papel financeiro do SFH. Trata-se de um expressivo aumento na parcela relativa de ORTNs nas reservas do BNH a partir de 1972. como podemos verificar mediante um exame dos balancetes do Banco.14 14 Banco Central do Brasil, op. cit acima nota 12, quadro 1.19.

Em relação ao ativo total do BNH, a proporção dessas Obrigações aumentou de 13% no final de 1971 para quase 20% um ano depois. Durante o mesmo período, o aumento desses haveres financeiros - como proporção do valor total dos refinanciamentos estendidos pelo BNH a seus agentes - foi ainda mais elevado, subindo de 16 para 25%. Ambas as proporções ainda se conservavam em fins de 1974. O BNH já se tornara então o maior tomador de ORTNs na economia brasileira, com uma participação de 23% no final de 1972.15 15 Banco Central do Brasil. Relatório 1973, Brasília, 1974. quadro. VI.3. A Renda familiar máxima permitida pela legislação original do PLANHAP, era de 12 UPC, valor que ficava aproximadamente equivalente a três salários mínimos no país como um todo, a partir de 1970. Valor médio da UPC: 1970 - Cr$ 45,21; 1971 - Cr$ 54,21; 1972 - Cr$ 65,30; 1973 - Cr$ 74,43; e 1974 Cr$ 89,01. Média ponderada aproximada dos salários mínimos nas capitais do Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Salvador e Recife: 1970 - Cr$ 165,00 a Cr$ 170,00; 1971 - Cr$ 205,00 a Cr$ 210,00; 1972 -Cr$ 240,00 a Cr$ 245,00; 1973 - Cr$ 280,00 a Cr$ 285,00 e 1974 - Cr$ 350,00 a 355,00.

Qual o significado de essa elevada proporção dos recursos do BNH ser investida em títulos do governo, ao invés de o ser em financiamentos de habitações ou de infra-estrutura urbana? Com efeito, as pessoas possuidoras de contas do FGTS, o qual constitui fonte primária dos recursos do banco, estariam financiando um tipo de investimento - a compra das ORTNs - do qual elas não estão recebendo benefícios diretos. Isto parece ser conseqüência natural de uma situação havendo, por um lado, uma dinâmica e constante fonte de fundos (o FGTS) e, por outro lado, um campo para aplicar esses fundos (o mercado habitacional e os diversos sistemas de serviços urbanos), que nem sempre apresenta condições adequadas para absorver investimentos. Durante épocas de difícil aplicação nas áreas fundamentais de atuação do BNH, as compras de ORTNs podem aumentar até níveis muito superiores àqueles previstos nas projeções orçamentárias, a fim de evitar que o dinheiro do banco fique estacionado enquanto continua a obrigação de remunerar as contas do FGTS.

Por quaisquer que fossem as razões, verificou-se em 1972 - ano de grande aumento proporcional das ORTNs no ativo do BNH - uma queda nas aplicações globais deste órgão no campo urbano. Como se pode ver na tabela 2 deste trabalho (a qual trata das quantias anuais que realmente chegaram a ser desembolsadas pelo BNH), e única faixa do mercado habitacional que não sofreu a mesma tendência geral de baixa em 1972 foi o subrnercado designado médio onde refinanciamentos do BNH se destinavam a famílias de renda média através da intermediação de agentes não-enquadrados no SBPE.

A natureza do papel financeiro desempanhado pelo BNH dentro do SFH é ilustrada no diagrama apresentado no subitem 3.1: um banco de segunda linha alocando fundos em vários outros intermediários, os quais, por sua vez, efetuam os empréstimos para construção de moradias. Dessa maneira, uma boa parcela dos recursos do FGTS, provenientes em parte dos grupos de rendas médias e superiores, é canalizada de volta aos mesmos grupos. Essa devolução estrutural é efetuada através das entidades do SBPE, das Cooperativas Habitacionais, de outros agentes não pertencentes ao SBPE, e dos bancos comerciais mediante o subprograma RECON (Refinanciamento ou Financiamento do Consumidor de Materiais de Construção), o qual financia materiais de construção para o próprio morador. As classes de renda inferior são atendidas, principalmente, por COHABs (Companhias de Habitação) através de Programas chamados Popular e Econômico.

A fronteira arbitrária adotada neste estudo para se efetuar a separação entre os grupos de renda baixa e os de renda média e alta constitui a original renda máxima da população - alvo do PLANHAP (Plano Nacional de Habitação Popular) - representando uma renda familiar não superior a três salários.16 16 Fundação Getulio Vargas. Conjuntura Econômica. Rio de Janeiro, v. 29, n. 1, p. 93, 98, jan. 1975. A análise de Carlos Langoni17 17 Langoni, Carlos G. Distribuição de renda e desenvolvimento econômico do Brasil. Rio de Janeiro, Expressão e Cultura, 1973. sobre o recenseamento de 1970 revela quão preponderantes são essas camadas de renda baixa nas cidades brasileiras. O salário mínimo na época do recenseamento variava de Cr$ 144,00 no Nordeste e Cr$ 187,00 no Centro-Sul, representando uma média ponderada de aproximadamente Cr$ 165,00 a 170,00. Se essa cifra for projetada na estrutura da distribuição de renda urbana em 1970, desenvolvida por Langoni e apresentada na tabela 2, verificaremos que aproximadamente 40% da população não ganhavam sequer um salário mínimo, sendo que cerca de 80% ganhavam menos de três salários mínimos. Deve-se destacar que a tabela 3 trata da distribuição de renda individual ao invés da renda familiar. Mas a comparação de Langoni com as distribuições de rendas pessoais e familiares no Brasil, como um todo, mostra que a participação relativa de cada faixa de 10% apresenta-se essencialmente a mesma em ambos os casos; não aparece nenhuma discrepância superior a um ponto percentual nos últimos sete grupos de 10%, sendo que em nenhum dos grupos aparece uma variação superior a dois pontos.18 18 Langoni, op. cit. acima nota 17, tab. 1.2., p. 26. As estimativas do próprio BNH indicam que aproximadamente 20% das famílias urbanas ganham menos de um salário mínimo, e que outros 45% ganham de um a três salários mínimos.19 19 Banco Nacional da Habitação. BNH avaliação e prespectivas. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. p. 99, Fundação Getúlio Vargas. Conjuntura Econômica, Rio de Janeiro, v. 28, n. 3, p. 75, mar. 1974.

4.1 Ênfase nos empréstimos maiores

A discriminação na tabela 4 reflete em que grau o SBPE veio desempenhar um papel predominante dentro do SFH, no suprimento de crédito ao mercado habitacional. As duas colunas do lado esquerdo, sendo conjugadas, revelam o montante total dos empréstimos para construção de habitações durante o ano, em cada categoria. Pode-se notar que o SBPE aumentou rapidamente sua participação no financiamento total do sistema, de 35% em 1971, para mais de 65% em 1973, bem como em 1974. Embora uma parte desse aumento relativo tenha sido motivada pelo custo unitário mais elevado das residências financiadas através do SBPE, a última coluna da tabela 4 mostra que esse sistema vem financiando quatro vezes mais o número de unidades cobertas pelos demais agentes do BNH, durante esses dois últimos anos.

Comparando-se as cifras nas duas primeiras colunas da tabela 4, observamos que a expansão do SBPE adveio principalmente de sua própria capacidade de captação de fundos, uma vez que o componente do BNH nos empréstimos do sistema diminuiu de 55%, em 1971, para 27%, em 1974. Embora esta queda na participação do BNH pudesse ser atribuída em parte à descontinuidade administrativa que acompanhou a sucessão na Presidência e na Diretoria do BNH, em março de 1974, há de se notar que a cifra para 1974 ultrapassou a de 1973 (23%). Parece, portanto, que o fator preponderante subjacente a essa tendência é a crescente independência financeira das instituições do SBPE, devido ao comportamento dinâmico das cadernetas de poupança.

Considerando-se que o governo julga financiamentos habitacionais como meio fundamental de estimular os investimentos nos centros urbanos do Brasil, a categoria "recursos de terceiros" na tabela 4 mostra um fenômeno importante. Ao examinar esse volume de investimentos na forma de aquisição de moradias provenientes dos próprios mutuários, verificamos que o montante gerado pelas aplicações do SBPE é sempre superior àquele resultante da atuação dos agentes o que era de se esperar em virtude dos níveis diferentes de renda dos indivíduos servidos pelos dois tipos de intermediários.

Os financiamentos concedidos pelas entidades do SBPE são ultrapassados sob este aspecto, apenas pelos do subprograma RECON. O fato de que esse subprograma consegue gerar um significante volume de investimento, aplicando muito menos recursos do SFH do que os desembolsados através do SFH, assinala o nível de renda bastante elevado de seus mutuários. Esta conclusão é reforçada quando se leva em consideração o curto prazo de amortização (24 meses, com carência de 12 meses) e a taxa de juros relativamente alta (10%) desta linha de crédito.

Embora não haja limite para o valor das residências financiadas através do SBPE, existe um teto de empréstimo que em maio de 1975 foi elevado de 2.250 para 3.500 UPC (Cr$ 417.445,00 ao valor da UPC no 3 º trimestre de 1975). Até o final de 1974, quando a tabela de taxas de juros do SFH foi formulada e unificada, conforme se observa na tabela 4, os empréstimos para moradia eram classificados em cinco faixas, em incrementos de 450 UPC cada. As taxas reais de juros (incluindo os encargos provenientes da concessão de crédito) variavam de 10% a 12% progressivamente nas primeiras quatro faixas, não havendo limite de taxas na classe mais elevada, ao. passo que a relação máxima entre o financiamento e o valor da moradia variava inversamente, de 90 até 76%, de acordo com a classe.

4.2 Esforços no sentido de regulamentar a alocação de crédito

As cinco faixas de crédito, além do estabelecimento de condições distintas para diferentes classes de financiamento, tinham outra função. A política do BNH sempre tem objetivado uma certa distribuição na concessão de empréstimos habitacionais entre várias camadas socioeconómicas. Desta forma, visando evitar que as instituições do SBPE concentrassem seus empréstimos na faixa V, com as taxas de juros livremente determinadas conforme o comportamento do mercado, o banco estabeleceu que só 30% - no máximo - das aplicações de cada entidade poderiam enquadrar-se nessa faixa de taxas de juros superiores. Por outro lado, exigiu-se que um mínimo de 10% total dos financiamentos fosse concedido às duas faixas de taxas de juros de 10%, onde o valor máximo de empréstimo, de 900 UPC, era o mesmo do teto das operações de crédito dos agentes não pertencentes ao SBPE.20 20 Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais, Rio de Janeiro. Sistema financeiro da habitação. Rio de Janeiro, IBMEC, 1974. p. 137-9.

Por vários motivos, porém, esses requisitos não lograram o impacto desejado no atendimento a famílias de renda inferior que receberam financiamentos pelas entidades do SBPE. Primeiramente, quanto a famílias necessitadas de empréstimos habitacionais em valores até 450 UPC, ou seja, o valor máximo para a faixa I do SBPE, verificamos, na tabela 5, que elas teriam gozado de taxas de juros menores através dos Programas Popular e Econômico, caso se enquadrassem dentro dos limites fixados para renda familiar. Esta diferença nas taxas podia ser justificada por motivos financeiros, visto que o custo dos fundos é mais elevado no SBPE do que nos outros programas - juros ou dividendos de 6% (mais correção monetária) pagos sobre as cadernetas de poupança e letras imobiliárias, em contraste com a taxa de 3% (mais correção monetária) paga na maioria das contas do FGTS.

Vemos portanto, que famílias pertencentes à classe média-baixa, cujos interesses a faixai devia atender, teriam sido induzidas a buscar financiamento fora do SBPE. Da mesma forma, famílias de rendas mais alta sentiam-se motivadas para procurar crédito imobiliário na faixa I. Uma vez que as faixas definiam-se em função do valor do empréstimo ao invés do valor da unidade a ser financiado, não havia meios de prevenir que uma parcela das aplicações na faixa I fosse usada como financiamento parcial para unidades de alto valor.

É evidente que, mesmo se a distribuição estipulada pelo BNH para aplicações entre as cinco faixas tivesse sido alcançada, existiriam fatores pontenciais para minar a distribuição efetiva dos créditos entre famílias de diferentes classes de renda. Devemos ressaltar que, entre os agentes financeiros do SBPE, poucas são as entidades que conseguiram manter os parâmetros de distribuição determinados pelo banco, referentes às faixas I e II, em face de uma valorização imobiliária que se desencadeava em ritmo maior do que o dos reajustes na UPC, principalmente nas áreas metropolitanas do Centro-Sul.

É provável que um reconhecimento dessa situação influenciou na decisão do Conselho Administrativo do BNH, em dezembro de 1974,21 21 Banco Nacional da Habitação. Resolução do Conselho de Administração n.º 36/74. Boletim de Serviço, Rio de Janeiro, v. 258, dez. 1974, p. 69-80. A partir de abril de 1975, os resultados dos refinanciamentos do BNH no mercado habitacional passaram a ser classificados na base das respectivas carteiras dentro do Banco, da seguinte forma: COS (Carteira de Operações Sociais), CPH (Carteira de Programas Habitacionais), SAF (Superintendência de Agentes Financeiros, RECON, e Operações Complementares. de abolir as cinco faixas de financiamento concomitante, no processo de unificação da tabela de taxas de juros por todo o SFH. Ao mesmo tempo, as autoridades do sistema visaram criar incentivos mais concretos para que os intermediários do SBPE efetuassem uma distribuição mais ampla dos seus créditos entre diferentes classes socioeconómicas. O mecanismo para concretizar este objetivo seria a adoção de taxas de juros variáveis nos refinanciamentos concedidos pelo BNH a seus agentes.

Até dezembro de 1974, taxas de juros para esses refinanciamentos eram apenas duas: 6% nos casos de entidades que seguiram o cronograma estabelecido pelo BNH para renegociar com seus mutuários, de acordo com os novos termos de crédito adotados pelo SFH em outubro de 1971, e 8% nos casos de entidades que não conseguiram segui-lo. Em contraste com este esquema, a tabela 5 mostra qual a sistemática das variações estabelecidas ao fim de 1974: 0% para refinanciamentos destinados a gerar financiamentos de valores até 200 UPC, depois aumentando em um ponto para cada incremento de 100 UPC no valor dos financiamentos com limite de 9% para financiamentos no valor de 1.100 UPC em diante.

Na tabela 4 são apresentadas as diferenças entre as taxas de juros de refinanciamento e de financiamento sob a regulamentação reformulada. Assim pode-se ter uma idéia das classes de empréstimos que o BNH está querendo incentivar. Quando havia apenas uma taxa para todos os refinanciamentos do BNH a determinado agente financeiro, era nitidamente vantajoso aplicar o máximo possível nas faixas de empréstimos com as taxas mais altas; isto indica também que recursos conseguidos dessa maneira não eram menos dispendiosos do que os captados através dos instrumentos financeiros do SBPE. Entretanto, com a tabela de taxas variáveis que agora está em vigor, as fórmulas utilizadas nos cálculos criam uma vantagem significativa na diferença para financiamentos de 401 até 800 UPC, atingem uma fração da antiga faixa I e maior parte da antiga faixa II. Ademais, para os empréstimos de até 700 UPC o custo desses fundos para as entidades é inferior ao custo dos recursos provenientes das cadernetas de poupança e letras imobiliárias.

Os limites do prazo tratado nesta estudo, o qual termina ao fim de 1975, não nos permitem determinar a eficácia desta mudança no que diz respeito à canalização de mais créditos do SBPE para famílias nessas faixas. A reação pública dos agentes nos primeiros meses foi de reclamar que o maior risco nestes empréstimos não compensa a diferença nas taxas de juros. E com o grande sucesso obtido com os depósitos de poupança, muitas entidades já diminuíram bastante sua dependência de refirefinanciamentos do BNH, como já vimos na tabela 4, e podem continuar operando com bom lucro nas faixas mais altas.

De certa forma, a adoção de taxas variáveis para refinanciamentos na área de SBPE pode ser considerada como requinte de um princípio que já se constitui em um alicerce de todo o SFH: o de indiretamente subvencionar as taxas de juros nos financiamentos menores mediante a cobrança de taxas de juros mais altas nos financiamentos maiores. Com apenas uma tabela englobando as operações de todos os agentes do- SFH, o mecanismo compensatório pode se tornar mais integrado do que anteriormente, quando as taxas para refmanciamentos não eram unificadas para todas as unidades. Dentro do SBPE, como já mencionamos, as taxas de refínancíamentos eram de 6 ou 8% ao passo que os outros agentes pagavam ao BNH taxas um ponto abaixo das taxas referentes aos respectivos financiamentos, como se verifica na tabela 6. Assim, o subsídio efetivo se dava basicamente através da diferença nas taxas cobradas pelo BNH de agentes distintos.

4.3 Suprimento de crédito para habitação fora do sistema de poupança e empréstimo

Passaremos agora a analisar as operações de crédito habitacional realizadas por esses agentes do BNH que não fazem parte do SBPE. A grande maioria das operações dessas entidades não pode ser consideradas como sendo orientadas para as famílias de rendas baixas, ou seja, aquelas que não percebem mais do que três salários mínimos de acordo com a definição adotada neste estudo. Com referência à tabela 6, notamos que a faixa central do Programa Econômico - abrangendo financiamentos de 281 até 320 UPC - era a que representava o alcance superior de atendimento àquelas famílias. Baseamo-nos no fato de que 320 UPC constituía o valor máximo para empréstimos concedidos mediante o PLANHAP, e também de que o teto da renda familiar referente a esta faixa -12 UPC vem-se mantendo mais ou menos equivalente a três Salários mínimos nos últimos anos.

Existe uma série de agentes ativamente empenhados na promoção e no financiamento de habitação na faixa de empréstimos superior à de interesse social onde as COHABs atuam, incluindo as Cooperativas Habitacionais, o INPS (Instituto Nacional de Previdência Social), os iniciadores do mercado de hipotecas, os montepios estaduais e municipais, as empresas (para seus empregados) e os clubes militares. Os dados sobre empréstimos habitacionais contratados, publicados pelo BNH, até 1975 eram classificados apenas segundo os programas, fato que impede uma determinação exata da discriminação entre os empréstimos de valores inferiores ou superiores a 320 UPC. Sabemos que todos os financiamentos do Programa Médio são superiores a este valor. Os dados disponíveis mostram que o volume em cruzeiros dos financiamentos concedidos por esse programa vinha-se expandindo uniformemente desde 1970, ao passo que o volume relativo aos outros dois programas vem diminuindo acentuadamente desde 1971.

Durante 1972 as operações dos agentes através desses três programas começaram a experimentar dificuldades relativas ao desembolso de fundos de empréstimo,22 22 Fundação Getúlio Vargas. Conjuntura Econômica. Rio de Janeiro, v. 27, n.º 1, p. 36, jan.1973. fato que pode ser observado na tabela 4, segundo a qual as contribuições suplementares dos agentes para 1972 e 1973 apresentam resultados negativos. Qualquer que tenha sido a natureza das dificuldades encontradas, elas afetaram primordialmente os empréstimos menores. Num esforço compensatório, o volume dos empréstimos no Programa Médio foi aumentado, e, como conseqüência, sua participação, em confronto com os outros dois programas, elevou-se de 10% em 1971, para 30% em 1972, e atingiu 43% em 197323 23 Banco Nacional da Habitação. BNH uma avaliação de 1973. Rio de Janeiro, 1974. p. 11. mimeogr. Estimamos o volume de empréstimos contraídos por famílias percebendo mais do que três salários mínimos mediante os Programas Econômico e Médio da maneira que se segue: embora exista uma discrepância significante e irreconciliável entre as cifras da tabela citada no rodapé 18 e a tabela 3 deste artigo, referente ao total de financiamentos realizados por "agentes" em 1973, é aquela tabela a única fonte disponível que discrimina subtotais para cada um dos três programas. Tomamos as parcelas percentuais do total assim determinadas, e as aplicamos à soma dos componentes "Recursos do BNH" e "Participação dos intermediários" para "agentes" em 1973, a qual atingiu Cr$ 2,1 milhões. Somando-se toda a parcela Médio (43,3%) à metade da parcela Econômico (45,0%), temos uma parcela total de 65,8% correspondente a um volume de Cr$ 1,3 milhão, representando, assim, nossa estimativa conservadora para o montante de empréstimos habitacionais proporcionados às classes de renda superior por entidades não pertencentes ao SBPE, em 1973. Seguimos o mesmo racioncínio com respeito aos saldos cumulativos do Boletim Mensal do BNH. É razoável admitir-se que exista uma tendência paralela entre as diversas faixas dentro do Programa Econômico. A julgar pelo crescimento rápido do Programa Médio, em relação aos outros dois que serviam às famílias de rendas mais baixas, pareceria relativamente conservador admitir que pelo menos 50% de todo o financiamento na categoria "Econômico" destinavam-se a empréstimos de 321 a 400 UPC. Foi essa, portanto, a relação aplicada para se chegar à nossa estimativa do fluxo de crédito dos intermediários não pertencentes ao SBPE para os grupos de rendas médias e altas, que aparece do lado extremo direito do diagrama já examinado.

5. A HABITAÇÃO POPULAR

O quadro que vem emergindo no decorrer de nosso exame de distribuição de empréstimos dentro do SFH mostra que nos primeiros anos da década de 70 houve um aumento crescente na proporção dos empréstimos que beneficiam os 20-30% da população urbana mais favorecida. Essa tendência não era estritamente uma função do dinamismo das fontes de recursos do SBPE. Apesar do fato de que um número considerável de famílias com rendas médias teve' oportunidades de adquirir casa própria (que jamais existiram antes da institucionalização do BNH), ficou evidente que o mecanismo financeiro, da forma que se apresentava, não era adequado para assegurar um impacto apropriado sobre o déficit maciço de moradias que ainda aflige o Brasil.

5.1 Criação do PLANHAP

O reconhecimento da inadequação das estruturas existentes resultou no primeiro passo definitivo para utilização da capacidade comprovada do SFH de captar recursos com vistas à expansão da disponibilidade de habitação popular, em termos financeiros apropriados a pessoas de rendas baixas. Em janeiro de 1973, o Presidente Emílio G. Medici instituiu o PLANHAP, que previa um investimento de Cr$ 30 bilhões, durante a década seguinte, para construção de 2 milhões de unidades para famílias com rendas entre um e três salários mínimos. As atividades projetadas seriam limitadas aos seguintes itens: cidades com mais de 50 mil habitantes, áreas metropolitanas ou pólos de desenvolvimento urbano oficialmente reconhecidos, cidades menores selecionadas acusando taxas de crescimento demográfico excepcionalmente elevadas, e áreas onde seria possível construir casas isoladas em lotes cujos proprietários seriam os mutuários finais.24 24 Banco Nacional da Habitação. Resolução do Conselho de Administração n.º 1/73. In: PLANHAP objetivos e normas de execução. Rio de Janeiro, 1973. p. 38-9. Mais urna vez, conforme ocorreu quando da criação do FGTS em 1966, o governo brasileiro utilizou-se de uma modificação na estrutura do SFH para fazer face a outras questões, além das referentes às da habitação. No caso do PLANHAP. a questão envolvida não era a indenização dos trabalhadores, mas a distribuição das riquezas na economia brasileira. As autoridades governamentais haviam ficado sensibilizadas com críticas amplamente disseminadas no exterior quanto às ineqüidades de distribuição de riquezas decorrentes do prosseguimento do surto de progresso econômico no Brasil. O mecanismo integrado de redistribuição de riqueza, implícito na nova iniciativa, representava um esforço no sentido de combater as condições que deram origem a esses comentários adversos.

Com o propósito de implementar a PLANHAP, um novo SIFHAP (Sistema de Financiamento de Habitação Popular) foi constituído dentro da estrutura já existente do SFH. Ao contrário do que se dera com o SBPE, para a implantação do SIFHAP não houve necessidade da formação de quaisquer instituições financeiras novas. Ao invés disso, foram especificadas novas relações entre os agentes do BNH e os governos estaduais e municipais participantes. As COHABs deviam constituir a pedra angular do sistema, que abrangeria todos os seus empréstimos habitacionais de até 320 UPC, e mais algumas operações de financiamento complementares.

A incorporação de governos estaduais e municipais no novo sistema teve como conseqüência a formação de um novo instrumento: os FUNDHAPs (Fundos Estaduais de Habitação Popular). A criação desses fundos representou a primeira participação governamental direta no SFH desde a verba federal para constituir o capital inicial do BNH, em 1964.

Os FUNDHAPs devem receber 2% das receitas tributárias dos respectivos governos estaduais, além das contribuições adicionais que os estados podem exigir dos municípios que se beneficiarem das atividades do PLANHAP.25 25 Banco Nacional da Habitação, op. cit. acima nota 22, p. 43 A função desses fundos é a de suplementar empréstimos do BNH para projetos específicos do PLANHAP. A determinação das respectivas proporções de fontes de fundos constitui um dentre os diversos mecanismos destinados a fomentar os projetos de habitação que servem aos pequenos mutuários; o percentual do financiamento pelo BNH concedido a um determinado projeto deverá ser inversamente proporcional ao valor unitário médio do projeto, sendo o saldo completado pelo respectivo FUNDHAP.26 26 Banco Nacional da Habitação, op. cit. acima nota 22, p. 45-6.

Os regulamentos do PLANHAP, além de procurarem incentivar a construção de habitações populares, proporcionam aos respectivos mutuários determinadas vantagens no que tange aos termos do financiamento aos quais estão sujeitos. Verifica-se nas tabelas 5 e 6 que os tomadores de empréstimos em valores inferiores aos tetos vigentes para o plano pagavam (e ainda pagam) as taxas de juros mais baixas do sistema, sendo suas prestações provavelmente as mais reduzidas em relação à renda familiar. No que concerne à renda familiar, os tetos relativos ao comprometimento permitido variam de 25 a 40%, de acordo com o tamanho da família e nível de renda.

Ao fim de 1975, porém, quase três anos depois da primeira comunicação oficial relativa à implementação do sistema PLANHAP. o processo de cooperação entre o BNH. as COHABs e os governos estaduais e municipais encontrava-se em andamento somente há pouco tempo. O mesmo acontece no que diz respeito aos numerosos programas complementares dentro do âmbito do PLANHAP, alguns dos quais serão abordados a seguir.

A Assessoria do Planejamento e Coordenação do BNH apresenta algumas explicações no tocante à demora em se colocar o esquema PLANHAP em funcionamento, à parte dos obstáculos burocráticos inevitáveis. É salientado que muitos governos estaduais relutavam em firmar convênios com o Banco para o estabelecimento do FUNDHAP, em virtude de restrições orçamentárias. Outrossim, diversas COHABs experimentaram dificuldades na aquisição de terrenos a preços suficientemente baixos para viabilizar a ; construção de unidades habitacionais de baixo custo. Além disso, o BNH assevera que apenas 1% de aproximadamente 4 mil municipalidades do Brasil possui a capacidade de endividamento essencial à participação na maioria dos projetos do PLANHAP.27 27 Banco Nacional da Habitação, Rio de Janeiro, BNH avaliação e perspectivas Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. p. 100. Atualmente, no entanto, o PLANHAP e seus subprogramas auxiliares presentam perspectivas alentadoras de aumentos na participação relativa do crédito, destinado a famílias de rendas baixas dentro do SFH.

5.2 Programas complementares

Nossa análise da distribuição do crédito proporcionada pelo sistema, entre os grupos de rendas baixas e o restante da população urbana, focalizou até agora empréstimos para a compra de unidades habitacionais. Existem, contudo, diversos subprogramas dentro do escopo do PLANHAP que proporcionam empréstimos identificáveis nitidamente sob a forma de benefícios aos residentes em conjuntos habitacionais construídos e financiados pelas COHABs, embora não sejam atribuídos diretamente aos compradores de residências de baixo custo. O total consolidado desses programa aparece no diagrama já examinado, sob o título "investimentos complementares em conjuntos habitacionais", beneficiando exclusivamente os grupos de rendas baixas.

Nesses programas, o BNH inicialmente coloca um crédito à disposição das COHABs, à taxa de 6%, para a compra de terras para a construção dos conjuntos habitacionais.28 28 Banco Nacional da Habitação. Resolução da Diretoria n.º 90/73,In: PLANHAP objetivos e normas de execução. Rio de Janeiro, 1973. p. 147-51. Embora essa prática não seja capaz de evitar a escassez e superavaliação concomitante dos imóveis, as quais têm dificultado a ação do PLANHAP desde sua implantação, os créditos vêm reforçar a capacidade das COHABs de concorrerem sob condições de mercado que, de outra maneira, lhes seriam desfavoráveis. Convém observar, contudo, que esse crédito pode também servir para impulsionar a valorização dos terrenos, elevando ainda mais, dessa maneira, os custos flo programa. Em casos assim, o direito de domínio eminente, que justifica a aquisição de terrenos pelo Governo, por um valor justo, para fins que servem ao interesse público, poderia ser aplicado mais energicamente pelas instituições habitacionais do governo, a fim de poupar as escassas disponibilidades financeiras mediante atenuação do custo dos terrenos.

Como parte integrante de sua perspectiva cada vez mais ampla, relativa à necessária integração de habitações com o ambiente urbano, o BNH estabeleceu uma série de subprogramas para financiamento de diversos empreendimentos públicos e privados, diretamente ligados aos conjuntos habitacionais gerados pelos membros integrantes do SIFHAP, incluindo os conjuntos construídos antes da implantação do SIFHAP. Os tipos de projetos por eles mantidos incluem: abertura de ruas, instalação de rede de água e esgoto, abastecimento de luz e gás, ajardinamento, concessão de benfeitorias comunitárias e até organização de estabelecimentos comerciais de pequeno porte. Uma característica interessante desse conjunto de operações vem a ser a ênfase deliberada na redistribuição regional dos recursos. As taxas de juros cobradas aos mutuários sejam eles agências governamentais, estaduais ou locais, ou empresários individuais - obedecem a uma escala que vai de 2 a 7%, e que varia de função de um coeficiente determinado pelo produto da receita tributária estadual pela densidade demográfica dos estados em que os respectivos conjuntos estejam localizados.29 29 Banco Nacional da Habitação. Resolução da Diretoria n.º 26/75. Boletim de Serviço, Rio de Janeiro, v. 263, jun.1975, p. 56. Dessa maneira, os estados mais prósperos que participam desses subprogramas contribuem numa escala proporcionalmente maior, para a sustentação do SIFHAP, do que os estados mais pobres.

Outra linha de crédito dessa natureza destina-se a famílias que estejam residindo em unidades dentro do âmbito operacional do PLANHAP, que não tenham atrasado os pagamentos e que procurem financiamentos adicionais para efetuarem melhorias em suas casas. No caso dessas famílias, 6 BNH autoriza as COHABs e os demais agentes a estenderem empréstimos a juros de 1%.30 30 Banco Nacional da Habitação, Resolução da Diretoria n.º 84/73. In: PLANHAP objetivos e normas de execução. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1973. p. 135-9.

5.3 Auxilio para construção pelos mutuários

Cabe lembrar, também, que um dos objetivos principais do SIFHAP é o de providenciar crédito às famílias que desejarem construir suas próprias moradias em lotes de terrenos já adquiridos, contanto que percebam pelo menos um salário mínimo. Esse esquema assemelha-se a outros já experimentados em vários lugares na América Latina, tendo os resultados sido bastante desiguais.31 31 Laun, John. Low-Cost urban housingin Colômbia, 1942-1972: the rethoric and reality of reform Berkeley, University of Califórnia, 1973. p. 19-20. mimeogr. No que diz respeito aos padrões mínimos das unidades financiadas dessa maneira, o BNH exige que o tamanho do lote esteja de acordo com as práticas locais, e que hajam ligações com as redes de serviços públicos locais. As taxas de juros são as mesmas vigentes para empréstimos habitacionais no SFH. Existe, ainda, outra disposição destinada a proporcionar crédito aos grupos de rendas baixas - a obrigatoriedade de cada agente aplicar pelo menos 45% desses empréstimos em moradias de valor inferior a 200 UPC.32 32 Banco Nacional da Habitação. Rio de Janeiro. Resolução da Diretoria n.º 92/73. In: PLANHAP op. cit. acima nota 30, p. 154-5. Essa abordagem poderia conduzir os mutuários a cooperarem entre si na compra de materiais e no processo de construção. Em alguns casos esse método pode resultar bastante oneroso em termos de tempo e de recursos físicos das famílias individuais.33 33 Perlman, Janice. Report on Squatter settlements and lowincome housing systems. Berkeley, University of California, 1974. p. 32. mimeogr. Todavia, essa prática é muito freqüente entre famílias de renda baixa, que constroem suas casas por conta própria, sem qualquer participação do SFH.

Através da elaboração das principais linhas de ação do PLANHAP, constatamos que o BNH tem afrouxado, de certa forma, as amarras financeiras de uma parte do SFH, à medida que os dirigentes do órgão têm-se compenetrado da necessidade de uma maior flexibilidade para atender às necessidades das famílias de baixos níveis de rendas. Aparentemente, mesmo as condições de financiamento menos rigorosas do PLANHAP são ainda excessivamente exigentes para as famílias mais pobres (aquelas sem renda fixa que percebem, em média, menos de um salário mínimo) que compreendem, de acordo com o BNH, 20% da população urbana do país.

Assim, os responsáveis pela política do BNH, levando em consideração a condição financeira dessas famílias, vêm resolvendo afrouxar um pouco mais as exigências do sistema, criando mais dois programas. Foi anunciada, em setembro de 1974, a extensão de um tipo de programa de habitação popular a vários centros urbanos do Brasil, o qual vêm funcionando há alguns anos em Recife, sob a designação de Projeto Embrião. Essa abordagem acarreta a provisão de uma unidade habitacional básica de, no mínimo, dois ou três cômodos providos das necessárias instalações, havendo possibilidade de o próprio morador estender as dependências de sua casa. As prestações mensais sugeridas seriam as mesmas do projeto executado em Recife, ou seja, de Cr$ 15,00 a Cr$ 20,00 durante um período de 20 anos.34 34 BNH inicia breve programa para construção de casa à população sem renda fixa. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, p. 16, 4 set.1974. Embora o Projeto Embrião, em Recife, não esteja eximido de problemas, segundo assevera uma observadora35 35 Perlman, op. cit. acima nota 33, p. 24-5. as dificuldades decorrentes parecem ser peculiares à respetiva localização. Um fator mais positivo observado foi que as habitações do projeto são consideradas resistentes, o que não deixa de provocar surpresa em face das prestações que representam menos de 10% do salário mínimo naquela cidade. Surge daí a esperança de se atingirem os mesmos padrões de qualidade em outras regiões do país, com prestações de equivalente valor percentual do salário mínimo.

Existe outro programa com um alcance social potencial bem amplo, que só chegou a ser definido pelo BNH em junho de 1975: o PROFILURB (Programa de Financiamento de Lotes Urbanizados).36 36 Banco Nacional da Habitação. Resolução do Conselho de Administração n.º 18/75. Boletim de Serviço, Rio de Janeiro, v. 264, ago. 1975, p. 159. Este programa baseiase em experiências bastante positivas já realizadas anteriormente em nível municipal nas cidades de São Luís e Fortaleza. Atuando através dos agentes do SIFHAP e visando famílias percebendo até cinco salários mínimos, o PROFILURB ultrapassa as outras linhas de ação do SFH para atender às necessidades na área de interesse social. O objetivo básico desse programa é o de possibilitar a aquisição por famílias de renda baixa de lotes providos de água, luz, drenagem e, para esgotos, pelo menos de uma fossa sanitária. Desta forma, as famílias poderão morar em barracos no local enquanto constroem as casas. Com o intuito de evitar que este tipo de financiamento se torne um instrumento de especulação imobiliária, o BNH exige que o mutuário final do crédito fixe residência no lote dentro de um prazo de 12 meses; em casos de urbanização de áreas faveladas, este prazo limita-se a quatro meses.

Levando-se em consideração as classes sociais que deverão ter acesso aos lotes urbanizados, as obrigações financeiras dos beneficiários não serão insignificantes. O valor da transferência do lote ao mutuário, limitado a 120 UPC, engloba muito mais do que o custo de aquisição e legalização do terreno. Incluídos nesse valor estão os custos das obras realizadas na preparação do lote (tais como terraplenagem, proteção e contenção de encostas, ligações com redes públicas de serviços urbanos, cavação de fossas) mais os serviços administrativos relacionados a estas obras, bem como a taxa de administração do BNH referente ao respectivo refinanciamento. As prestações, sujeitas à correção monetária e integradas por um componente de juros à taxa anual de 1%, incluirão também as taxas características do SFH, equivalentes a 20% do valor corrigido da prestação inicial. No entanto, o PROFILURB apresenta uma inovação que poderia significar grande vantagem para os participantes do programa. A obrigação do mutuário de fixar residência no lote dentro de um período máximo de 12 meses constitui-se em forma de concessão de uso ou de promessa de compra e venda, de tal modo que, se o mutuário desistir do contrato dentro do prazo, ele receberia tanto uma indenização por melhorias realizadas por conta dele, quanto a devolução daquela parcela das prestações pagas correspondente à amortização do capital menos o custo de quaisquer danos materiais verificados nas instalações. Este dispositivo poderá diminuir muito o risco de prejuízos financeiros assumido pelas famílias de rendas instáveis beneficiadas pelo PROFILURB.

Assim temos um exemplo da flexibilidade imprescindível - por parte das autoridades governamentais na área do SFH - ao se lidar com o problema de colocação de moradias ao alcance de famílias de renda baixa. Na verdade representa um passo positivo no sentido de uma política habitacional orientada a favor do consumidor em vez do produtor, para empregar os termos de referência do antropólogo norte-americano Anthony Leedas.37 37 Leedas, Anthony. Political, economic and social effects of producer and consumer orientations toward housing in Brazil and Peru. In: Rabinovitz, Francine F. & Trueblood, Felicity ed. National-local linkages: the interrelationship pf urban and national polities in Latin America -Latin American urban research. Beverly Hills, Londres, Sage Publications, 1973. V. 3, p. 181-215. Contudo, a manutenção do ônus das taxas ubíquas do SFH indica que a estrutura básica do sistema continua sob uma orientação a favor do produtor.

Essa orientação nas operações do sistema tem exercido uma influência sobre a disposição das casas comercializadas através dos agentes financeiros do BNH, especialmente nas áreas de competência das carteiras de operações sociais e de programas habitacionais dentro do banco. Segundo declaração feita em setembro de 1974 pelo atual presidente do BNH, Sr. Maurício Schulman, apenas 3% das 270.000 unidades administrativas pelas COHABs, na época, encontravam-se abandonadas por incapacidade dos mutuários de manter os pagamentos em dia.38 38 BNH inicia breve programa para construção dc casa à população sem renda fixa. op. cit. acima nota 34. Este fato, porém, não reflete a situação das inadimplências na área das COHABs. Dados globais a esse respeito são confidenciais, e a imprensa geralmente cita apenas os casos mais flagrantes. Entretanto, existe um estudo desenvolvido em 1973, sob os auspícios do BNH, em 15 conjuntos populares localizados em diversas cidades do país, incluindo os projetos-modelo das cidades de Recife, Fortaleza e São Luís.39 39 Perlman, op. cit. acima nota 33, p. 11-11a. Esse estudo constatou a existência de uma variação considerável nas taxas de inadimplência por parte dos mutuários. Em cinco dos conjuntos, estimou-se que o percentual de mutuários em dia com as prestações correspondia a mais de 80%, enquanto em outros esta cifra baixou até 14%.

Uma conclusão relevante no relatório desse estudo, e que vem sendo reforçada no decorrer das nossas próprias indagações, é que os conjuntos habitacionais populares mais bem sucedidos - onde, por exemplo, existem as meñores taxas de inadimplência - são, via de regra, aqueles que incluem programas intensos de assistência social e integração comunitária como parte fundamental do projeto. Esta observação também nos parece válida para os raros casos em que entidades do SBPE participaram diretamente na comercialização de conjuntos para famílias com rendas nas faixas atendidas pelas COHABs. Uma experiência muito positiva, nesse sentido é um conjunto financiado pela APEX - uma das associações de poupança e empréstimo construído nos arrabaldes de Niterói. É importante reconhecer que, pela sua própria natureza, o investimento em atividades auxiliares implica a participação do setor público, qualquer que seja o agente financeiro para as unidades habitacionais.

6. O OUTRO LADO DA MOEDA CORRIGIDA

Salientamos anteriormente o papel fundamental desempenhado pelo mecanismo da correção monetária na captação das poupanças voluntárias pelo SFH. É igualmente significativa e muito mais controvertida a aplicação desta correção à amortização dos empréstimos recebidos dos agentes do sistema. A correção monetária é tida como necessária, sob condições inflacionárias, a fim de evitar o ressurgimento da situação prevalecente no começo da década de 60, quando o valor real, tanto dos aluguéis como das prestações de amortização, declinava violentamente em face dos controles impostos aos aluguéis e dos tetos aplicados às taxas nominais de juros. Como resultado, os investimentos em imóveis reduziram-se, deixando como legado uma acentuada escassez de moradias para todas as classes sociais. Outro motivo apresentado para a aplicação da correção monetária aos saldos dos empréstimos é que a correção monetária vem sendo paga às três principais fontes de recursos do SFH, de tal modo que, se não forem corrigidas monetariamente as aplicações dos correspondentes recursos, ocorreriam perdas e falta de liquidez dos intermediários financeiros participantes do programa de habitação.

Do ponto de vista dos mutuários, no entanto, a correção monetária tem provocado reivindicações mais acentuadas do que qualquer outro aspecto do SFH. De acordo com o SAC (Sistema de Amortizações Constantes), adotado para os contratos de empréstimos em todo o programa em 1971, o valor real das prestações diminui em relação ao salário mínimo no decorrer do período da amortização. Não obstante, o crescente valor nominal das prestações, como conseqüência da correção monetária, é dificilmente entendido pela maioria dos mutuários, provocando reações violentas. De fato, nenhum tipo de reforma nos métodos de cálculo do montante da correção monetária conseguiu até agora abrandar as contínuas reclamações dirigidas ao BNH.

Os mutuários do sistema podem atualmente escolher entre dois métodos de reajuste das suas obrigações hipotecárias. Um desses métodos está em vigor desde o começo das operações do BNH, e funciona aproximadamente da mesma forma que a correção monetária do passivo das instituições do SFH, com reajustes trimestrais equivalentes às alterações do valor da UPC. Em 1969 formulou-se um segundo método, que logo se tornou o preferido, provavelmente pelo fato de acarretar ajustes menos freqüentes, facilitando, assim, o planejamento financeiro por parte das famílias. Com esse segundo método, os reajustes anuais baseavam-se nos aumentos do salário mínimo.

Constatou-se depois, porém, que a partir de 1969 o índice do aumento do salário mínimo sempre excedia o índice anual de correção monetária baseada nas ORTNs. Como esta situação estivesse prejudicando aqueles mutuários optantes pelo segundo método de reajustes, as autoridades monetárias determinaram, em fevereiro de 1973, que a percentagem de reajuste aplicada a contratos de financiamentos do SFH não poderia mais superar o índice da correção do valor nominal das ORTNs.40 40 Banco Central do Brasil. Circular n.º 200. Boletim do Banco Central do Brasil, Brasília, v. 9, n.º 4, p. 159, abr. 1973 anexo.

Nada disso, porém, teve repercussão igual àquela do incentivo fiscal concedido aos mutuários do SFH através do Decreto-lei n.º 1358, de 12 de novembro de 1974. Embora tenha a forma básica de uma dedução de 10% do total das prestações pagas durante o ano-base, distingue-se dos outros incentivos fiscais vigentes na economia brasileira pelo seu efeito nitidamente progressivo: além de um montante máximo para a dedução (Cr$ 3.000,00), existe também um montante mínimo (Cr$ 240,00), mesmo para os mutuários isentos de imposto de renda. Devemos também frisar que os benefícios desta medida não repercutem na distribuição da renda propriamente dita, e sim na distribuição das riquezas, uma vez que a dedução vai se efetivar na qualidade de créditos nas prestações pagas no futuro. Portanto, esse Decreto-lei visa incentivar os mutuários a se manterem em dia com as prestações, ao mesmo tempo que toma essas prestações menos onerosas.

Supõe-se que houve mais do que 650.000 beneficiários dessa medida logo no primeiro ano, 1974. Em dezembro de 1975 a alíquota da dedução foi elevada desde 10 para 12%, e o montante mínimo subiu para Cr$ 480,00. Valores desses constituíram alívio apreciável para aqueles mutuários mais carregados pela instituição da correção monetária.

7. CONCLUSÕES

Este estudo ilustra a maneira pela qual um programa - o Sistema Financeiro da Habitação do Brasil - serve de veículo para atrair, para fins de habitação, poupanças voluntárias e involuntárias em benefício de mutuantes e mutuários de diversos níveis de renda. Do ponto de vista de fontes de fundos, o sistema proporciona aos poupadores não só cadernetas de poupança, mas também letras imobiliárias, sujeitas à correção monetária. Esses programas têm obtido um êxito notável. De modo geral, a correção monetária dos ativos financeiros tem preservado seu valor real. A correção toma essas aplicações atrativas aos poupadores de vários níveis socioeconômicos, em virtude das taxas de inflação de 15 a 30% verificadas em anos recentes. Sem esse programa, uma parte desses fundos teria certamente sido canalizada ao consumo (principalmente no caso daqueles que participaram com depósitos de pequenos valores), ao invés de se constituir em poupanças, e outra parte teria sido uti-. lizada para investimento em haveres reais ou financeiros alternativos (como no caso dos depósitos de poupança maiores e das letras imobiliárias).

Uma vez que a maioria dos demais ativos financeiros no Brasil, excessão feita às ações das SCAs (sociedades anônimas de capital aberto), está sofrendo correção monetária, não se pode dizer que o programa vem desviando recursos financeiros de outras aplicações tão somente em virtude da preservação de um retorno real (conforme ocorreu no Programa UPAC da Colômbia).41 41 Hanson, op. cit. acima nota 5. Todavia, no caso do Brasil, essas políticas tem contribuído para o aumento maciço dos recursos disponíveis às instituições integrantes do SFH. Esses fundos, juntamente com os provenientes das poupanças do FGTS, além de permitirem ao SBPE, bem como a outros agentes, estar sempre em dia com a crescente demanda habitacional por parte das classes médias e altas (aquelas situadas na faixa superior - 20% na distribuição das rendas) nas principais cidades brasileiras, também lhes facultou mostrar certo progresso em reduzir tanto o déficit de habitações populares, quanto as necessidades de programas gerais da infra-estrutura urbana.

Um dos principais benefícios do programa, do ponto de vista de todos os poupadores, tem sido o de se proporcionarem ativos financeiros corrigidos monetariamente, capazes de garantir o valor real das poupanças. Houve também certo progresso na utilização desses fundos, juntamente com as poupanças contratuais, para subsidiar empréstimos a mutuários de parcos recursos. O método aplicado tem sido o de se cobrarem taxas diferenciais de juros aos mutuários, em conformidade com seu poder aquisitivo, e de se oferecerem taxas de depósitos com correção monetária a todos. Assim sendo, com referência às fontes de fundos, o programa tem apresentado retornos proporcionais, ao invés de progressivos ou regressivos - considerando-se, porém, que o respectivo incentivo fiscal tem um efeito regressivo moderado. No lado da aplicação dos fundos, a manutenção da política de proporcionar taxas de empréstimos mais baixas aos mutuários mais pobres, em vez de determinar as taxas segundo critérios exclusivamente financeiros, representa um esforço da parte das autoridades brasileiras a fim de incentivar aumentos no estoque de riqueza detido pelas classes populares sob a forma de casa própria.

Em face das políticas adotadas na maioria dos países em vias de desenvolvimento, que tendem a ser regressivas em termos do retorno de ativos financeiros, razão pela qual os grupos de rendas mais baixas recebem geralmente taxas de juros inferiores e até negativas sobre suas poupanças financeiras, o programa brasileiro constitui um passo definitivo na direção da eqüidade social (ou pelo meríos no sentido do afastamento da ineqüidade social). Em termos de aplicação dos fundos, contudo, o nosso estudo indica que a maioria dos recursos do programa, até o presente momento, é utilizada para financiar habitações para os grupos de renda baixa ou alta, ao invés da construção de habitações para as classes menos favorecidas. Revela, ainda, que houve uma intensificação dessa tendência, nos primeiros anos da década de 70, sendo um dos motivos o fato de a política de correção monetária - responsável pelo êxito do programa em atrair fundos - implicar um contínuo ajuste do valor nominal das prestações de amortização da dívida, a fim de permitir ao programa a retenção de sua liquidez. Embora essas prestações não aumentem em valor real, existe, no processo de reajustes, um aspecto politicamente impopular, principalmente para os componentes dos grupos de rendas baixas, que experimentam a erosão de suas rendas reais em face de reajustes salariais que tendiam, antes do reajuste de maio de 1975, a se situar aquém dos aumentos verificados nos preços.

Resta saber se um programa autêntico de empréstimos para habitações populares, em bases maciças, poderia ser mobilizado, com capacidade de simultaneamente eliminar uma alta proporção do déficit de moradias populares e assegurar a ocupação permanente das unidades pelos mutuários, mantendo-se ao mesmo tempo a liquidez do programa. É provável que um programa desse tipo teria de depender de uma flexibilidade por parte do governo no uso de subsídios de taxas de juros, subsídios estes do tipo estabelecido pelo Decreto-lei n.º 1358, para que as fontes de recursos voluntários e contratuais pudessem reter suas taxas de retorno real positivas. E se isso não acontecesse, as fontes de poupanças voluntárias bem poderiam reduzir-se, ao passo que os poupadores contratuais entre os grupos de rendas baixas seriam, por um lado, tributados sob a forma de rendimentos negativos dos depósitos em suas contas no FGTS e, por outro, beneficiados por subsídios nas taxas de juros.

Atualmente, contudo, o fluxo líquido de fundos entre os setores privado e público, através do programa habitacional, parece favorecer antes ao próprio governo, uma vez que o programa é utilizado para financiar obras de infra-estrutura governamentais, bem como a aquisição de títulos da dívida pública. Assim sendo, até a criação do PLANHAP, o SFH representou um canal de poupanças financeiras que fluíam do setor privado para o setor público, sendo que alguns elementos são mais progressivos na sua incidência do que outros. Constitui também um canal de fundos provenientes de todos os grupos de renda na direção de proprietários de unidades habitacionais de faixas inferior, média e superior, com crescente ênfase nos últimos dois grupos. Nada existe, porém na própria natureza do programa ou na de suas instituições, que exija o prosseguimento da referida situação. De fato, o conceito original diferia bastante da prática seguida nos últimos anos. Agora, em face do novo impulso proporcionado pela implantação dos diversos programas de crédito do PLANHAP e das várias iniciativas para com as famílias sem renda fixa, o SFH pode ter começado a realizar seu potencial de suprimento da massa da força de trabalho urbana com acesso seguro a subsídios indiretos no que se refere à aquisição de moradias. Há muito ainda a se fazer no sentido de melhorar a capacidade de acesso à posse de cadernetas de poupança, bem como ao crédito de baixo custo para habitação, fora dos grandes centros urbanos do país. É de se esperar que o programa continue a se estender também nesse sentido.

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  • Reynolds, Clark W. The use of flow of funds analysis in the study of Latin American capital market development. International Review the history of Banking, n.ş 9, 1974.
  • *
    Este artigo é baseado num trabalho intitulado "Housing finance in Brazil: towards a new distribution of wealth", que saiu publicado em
    Urbanization and inequality: the political economy of urban and rural development in Latin America, v. 5 da série "Latin American Urban Research", editado por Wayne A.. Cornelius e Feiicity M. Trueblood (Beverly Hills, Londres, Sage Publications, 1975), p. 147-74.
  • 1
    Reynolds, Clark W. The use of flow of funds analysis in the study of Latin American capital market development.
    International Review of the History of Banking, Institut International D'Histoire de la Banque, n. 9,1974.
    (Revue International d'Histoire de la Banque).
    A inovação motodológica adotada no presente estudo é a aplicação de análise de fontes e uso de fundos (fluxo de fundos) ao estudo de um principal subsetor de intermediação financeira no processo de desenvolvimento. O estudo é destinado a determinar, mediante a associação dos fluxos financeiros com as principais atividades e respectivos grupos de rendas, qual a incidência da política de financiamento de habitação na configuração da alocação de recursos e da distribuição de riqueza. Dessa forma, ele faz parte de um programa mais generalizado de pesquisa por parte dos autores sobre as interações entre os setores real e financeiro no processo de desenvolvimento, sua relação com a política financeira e as implicações de crescimento e bem-estar.
  • 2
    Veja. por exemplo. Banco Nacional da Habitação.
    Pronunciamento no Senado Federal: Mauricio Schulman (Comissão de Legislação Social. 16 set. 1975). Rio de Janeiro. Secretaria de Divulgação. 1975. p. 22. onde o presidente do BNH defendeu esse princípio face às críticas de alguns senadores da Oposição.
  • 3
    Entre os melhores exempos desse tipo de abordagem analítica considera-se o trabalho
    FGTS: uma política de bem estar social. por Wanderley J. M. de Almeida e José Luiz Chautard, Rio de Janeiro, IPEA, 1967.
  • 4
    Banco Nacional da Habitação.
    BNH documenta. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. Contrasta-se à situação que existia na Colômbia, onde os instrumentos financeiros sujeitos à correção monetária (UPACs - Unidades de Poder Aquisitivo Constante) produziram distorções nos fluxos financeiros. O resultado foi uma proporção excessivamente elevada de investimentos nas residências urbanas, com relevantes conseqüências na distribuição da riqueza entre grupos de rendas diferentes, bem como na utilização da mão-de-obra nas zonas rurais e urbanas, e no crescimento do capital acionário em poder do público
    (capital stock).
  • 5
    Hanson, J.
    Estimación de ahorro familiar en Colombia, mimeogr. As exceções dizem respeito às contas onde os depositantes não têm mudado de empresa desde antes da unificação da taxa de juros pela Lei n.º S70S, de 21 de setembro de 1971. Nesse caso específico, as contas fazem jus a incrementos periódicos da taxa de juros auferida, até um máximo de 6% depois do décimo ano, contanto que o depositante fique empregado pela mesma empresa.
  • 6
    Banco Naciona da Habitação. Coordenação Geral do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.
    Instruções sobre o FGTS. 4. ed. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. p.36-51.
  • 7
    Banco Nacional da Habitação.
    BNH orçamento plurianual 1974 -1976. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. p. 83; Banco Central do Brasil.
    Boletim do Banco Central do Brasil; Brasília, 1974/1975. Esta cifra é baseada em uma representação do sistema financeiro brasileiro mais ampla do que aquela apresentada no quadro "Principais haveres financeiros - emissão do Sistema Financeiro e Tesouro Nacional, do
    Boletim do Banco Central. Com referência ao
    Relatório Anual 1974 do Banco Central, complementamos o quadro III.2 com dados referentes aos seguintes haveres financeiros: arrecadação líquida do FGTS (quadro III.24) e do PIS (quadro III.28), e as reservas das empresas seguradoras (quadro III.20). Levamos em consideração, também, o estoque de ações, o qual foi calculado da seguinte maneira: aproveitamos os dados para o valor nomimal a preços correntes do estoque de ações das empresas registradas na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro em fins de 1972, apresentados por Claudio R. Contador em seu livro
    Mercado de ativos financeiros no Brasil - perspectiva histórica e comportamento recente, tabela 3.5.,p. 105. A este saldo acrescentamos o valor nominal das ações emitidas durante 1973 (soma dos itens 9 e 38 no quadro IV.2 do
    Boletim). Assim, chegamos a um saldo total de haveres financeiros de Cr$ 260,5 bilhões, em fins de 1973, sendo o saldo de haveres financeiros não-monetários de apenas Cr$ 166,7 bilhões, estando as debêntures, neste caso, fora de consideração.
  • 8
    Almeida & Chautard, op. cit. acima nota 3, tabela A.6, p. 156-7.
  • 9
    Almeida & Chautard, op. cit. acima nota 3, tabela 11.7, p. 97, conforme o procedimento detalhado no subitem 3.1, na nota. Antes da unificação da taxa de juros sobre as Letras Imobiliárias em maio de 1974, essas taxas variavam de 6 a 8%.
  • 10
    Banco Central do Brasil.
    Relatório Anual 1975. Brasília, mar. 1976. quadro III. 12.
  • 11
    Banco Nacional de Habitação. Superintendência de Agentes Financeiros.
    O Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo: Análise de 1972/1973. Rio de Janeiro, mar.1974. p. 36, 39.
  • 12
    Banco Central do Brasil.
    Boletim do Banco Central do Brasil. Brasília v. 13, n.º 3, p. 126, mar.1977. quadro 1.34. O valor a ser utilizado para a coversão da UPC em cruzeiros deveria ser aquele em vigor durante o último trimestre do ano. Desta forma, para 1974 o valor operacional da UPC teria sido de Cr$ 101,90, estabelecendo-se assim um teto de depósitos beneficiáveis com a vantajosa dedução de 6% do imposto devido no nível de Cr$ 40.760,00 que, por sua vez, vem a ser mais de 11 vezes maior do que o saldo médio global no SBPE ao fim de 1974 -Cr$ 3.585,00.
  • 13
    Banco Central do Brasil.
    Relatório, Brasília, p. 113, 1974. O incentivo fiscal referente às cadernetas de poupança funciona como muitos dos outros elaborados pelo govemo brasileiro dentro do sistema financeiro do país, no sentido de conceder maiores benefícios às classes mais favorecidas. Além do fato de que as alíquotas progressivas servem para valorizar as deduções de acordo com a renda de uma pessoa que paga imposto de renda, deve-se lembrar que são apenas estas pessoas que podem ser beneficiadas. Para o ano-base de 1973, por exemplo, as pessoas cujas rendas anuais atingiam Cr$ 70.700,00 eram isentas de pagar imposto de renda; levando em consideração o décimo-terceiro salário, essa cifra anual representava uma renda mensal de 2,6 vezes o salário mínimo efetivamente aplicado nas capitais de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte durante 1973. Ademais, se forem levadas em consideração as deduções permitidas, era preciso ganhar Cr$ 13.000,00 anuais, no mínimo (o equivalente a 3,3 vezes o maior salário mínimo vigente no país), antes de dever o equivalente a Cr$ 100,00 em imposto de renda.
  • 14
    Banco Central do Brasil, op. cit acima nota 12, quadro 1.19.
  • 15
    Banco Central do Brasil.
    Relatório 1973, Brasília, 1974. quadro. VI.3. A Renda familiar máxima permitida pela legislação original do PLANHAP, era de 12 UPC, valor que ficava aproximadamente equivalente a três salários mínimos no país como um todo, a partir de 1970. Valor médio da UPC: 1970 - Cr$ 45,21; 1971 - Cr$ 54,21; 1972 - Cr$ 65,30; 1973 - Cr$ 74,43; e 1974 Cr$ 89,01. Média ponderada aproximada dos salários mínimos nas capitais do Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Salvador e Recife: 1970 - Cr$ 165,00 a Cr$ 170,00; 1971 - Cr$ 205,00 a Cr$ 210,00; 1972 -Cr$ 240,00 a Cr$ 245,00; 1973 - Cr$ 280,00 a Cr$ 285,00 e 1974 - Cr$ 350,00 a 355,00.
  • 16
    Fundação Getulio Vargas. Conjuntura Econômica. Rio de Janeiro, v. 29, n. 1, p. 93, 98, jan. 1975.
  • 17
    Langoni, Carlos G. Distribuição de renda e desenvolvimento econômico do Brasil. Rio de Janeiro, Expressão e Cultura, 1973.
  • 18
    Langoni, op. cit. acima nota 17, tab. 1.2., p. 26.
  • 19
    Banco Nacional da Habitação.
    BNH avaliação e prespectivas. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. p. 99, Fundação Getúlio Vargas.
    Conjuntura Econômica, Rio de Janeiro, v. 28, n. 3, p. 75, mar. 1974.
  • 20
    Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais, Rio de Janeiro.
    Sistema financeiro da habitação. Rio de Janeiro, IBMEC, 1974. p. 137-9.
  • 21
    Banco Nacional da Habitação. Resolução do Conselho de Administração n.º 36/74.
    Boletim de Serviço, Rio de Janeiro, v. 258, dez. 1974, p. 69-80. A partir de abril de 1975, os resultados dos refinanciamentos do BNH no mercado habitacional passaram a ser classificados na base das respectivas carteiras dentro do Banco, da seguinte forma: COS (Carteira de Operações Sociais), CPH (Carteira de Programas Habitacionais), SAF (Superintendência de Agentes Financeiros, RECON, e Operações Complementares.
  • 22
    Fundação Getúlio Vargas.
    Conjuntura Econômica. Rio de Janeiro, v. 27, n.º 1, p. 36, jan.1973.
  • 23
    Banco Nacional da Habitação.
    BNH uma avaliação de 1973. Rio de Janeiro, 1974. p. 11. mimeogr. Estimamos o volume de empréstimos contraídos por famílias percebendo mais do que três salários mínimos mediante os Programas Econômico e Médio da maneira que se segue: embora exista uma discrepância significante e irreconciliável entre as cifras da tabela citada no rodapé 18 e a
    tabela 3 deste artigo, referente ao total de financiamentos realizados por "agentes" em 1973, é aquela tabela a única fonte disponível que discrimina subtotais para cada um dos três programas. Tomamos as parcelas percentuais do total assim determinadas, e as aplicamos à soma dos componentes "Recursos do BNH" e "Participação dos intermediários" para "agentes" em 1973, a qual atingiu Cr$ 2,1 milhões. Somando-se toda a parcela Médio (43,3%) à metade da parcela Econômico (45,0%), temos uma parcela total de 65,8% correspondente a um volume de Cr$ 1,3 milhão, representando, assim, nossa estimativa conservadora para o montante de empréstimos habitacionais proporcionados às classes de renda superior por entidades não pertencentes ao SBPE, em 1973. Seguimos o mesmo racioncínio com respeito aos saldos cumulativos do
    Boletim Mensal do BNH.
  • 24
    Banco Nacional da Habitação. Resolução do Conselho de Administração n.º 1/73. In:
    PLANHAP objetivos e normas de execução. Rio de Janeiro, 1973. p. 38-9.
  • 25
    Banco Nacional da Habitação, op. cit. acima nota 22, p. 43
  • 26
    Banco Nacional da Habitação, op. cit. acima nota 22, p. 45-6.
  • 27
    Banco Nacional da Habitação, Rio de Janeiro,
    BNH avaliação e perspectivas Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1974. p. 100.
  • 28
    Banco Nacional da Habitação. Resolução da Diretoria n.º 90/73,In:
    PLANHAP objetivos e normas de execução. Rio de Janeiro, 1973. p. 147-51.
  • 29
    Banco Nacional da Habitação. Resolução da Diretoria n.º 26/75.
    Boletim de Serviço, Rio de Janeiro, v. 263, jun.1975, p. 56.
  • 30
    Banco Nacional da Habitação, Resolução da Diretoria n.º 84/73. In:
    PLANHAP objetivos e normas de execução. Rio de Janeiro, Secretaria de Divulgação, 1973. p. 135-9.
  • 31
    Laun, John.
    Low-Cost urban housingin Colômbia, 1942-1972: the rethoric and reality of reform Berkeley, University of Califórnia, 1973. p. 19-20. mimeogr.
  • 32
    Banco Nacional da Habitação. Rio de Janeiro. Resolução da Diretoria n.º 92/73. In:
    PLANHAP op. cit. acima nota 30, p. 154-5.
  • 33
    Perlman, Janice.
    Report on Squatter settlements and lowincome housing systems. Berkeley, University of California, 1974. p. 32. mimeogr.
  • 34
    BNH inicia breve programa para construção de casa à população sem renda fixa.
    Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, p. 16, 4 set.1974.
  • 35
    Perlman, op. cit. acima nota 33, p. 24-5.
  • 36
    Banco Nacional da Habitação. Resolução do Conselho de Administração n.º 18/75.
    Boletim de Serviço, Rio de Janeiro, v. 264, ago. 1975, p. 159.
  • 37
    Leedas, Anthony. Political, economic and social effects of producer and consumer orientations toward housing in Brazil and Peru. In: Rabinovitz, Francine F. & Trueblood, Felicity ed.
    National-local linkages: the interrelationship pf urban and national polities in Latin America -Latin American urban research. Beverly Hills, Londres, Sage Publications, 1973. V. 3, p. 181-215.
  • 38
    BNH inicia breve programa para construção dc casa à população sem renda fixa. op. cit. acima nota 34.
  • 39
    Perlman, op. cit. acima nota 33, p. 11-11a.
  • 40
    Banco Central do Brasil. Circular n.º 200.
    Boletim do Banco Central do Brasil, Brasília, v. 9, n.º 4, p. 159, abr. 1973 anexo.
  • 41
    Hanson, op. cit. acima nota 5.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Out 1977
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