Centro da cidade do Rio de Janeiro: proposta de enquadramento como Bem Cultural Nacional da Primeira República (1889-1930)

Julio Cesar Ribeiro Sampaio

SAMPAIO, Julio Cesar Ribeiro. Centro da cidade do Rio de Janeiro: proposta de enquadramento como Bem Cultural Nacional da Primeira República (1889-1930). 19&20, Rio de Janeiro, v. XIV, n. 2, jul.-dez. 2019. https://www.doi.org/10.52913/19e20.XIV2.02

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1.     Este trabalho objetiva avaliar a condição do Centro da Cidade do Rio de Janeiro como Patrimônio Cultural Nacional e também como parte do Patrimônio Mundial, enquadrado, especificamente, no conceito de Paisagem Cultural. Em especial, pretende rever “valores universais excepcionais” e a ideia de “patrimônio nacional” do caso brasileiro, sobretudo em relação à categoria das cidades ditas “históricas.”

2.     O artigo inicia com uma breve abordagem da conservação de áreas urbanas no Brasil, a fim de fornecer subsídios para o estudo da proteção atual do Centro da Cidade do Rio do Janeiro, reavaliando essa situação. Em seguida, analisa a formação do Centro do Rio. Discute, especialmente, a sucessão de três paisagens urbanas que se constituíram no Período Colonial (entre o século XVI e início do XIX), na Era Republicana (notadamente, na Primeira República, no fim da década de 1890 até a Revolução de 1930), e ao longo da renovação urbana ocorrida a partir da década de 1940, fundamentada nos cânones das cidades modernistas preconizados pela Carta de Atenas de 1933, de Le Corbusier.

3.     Na etapa seguinte, o texto concentra-se na avaliação das condições atuais da área em evidência, composta por um diversificado grupamento de edificações majoritariamente protegidas. Este conjunto arquitetônico é composto por prédios tombados, de notáveis méritos, de todos os citados períodos históricos, entre os quais se situa um extenso conjunto, com cerca de quatro mil edificações contextuais, salvaguardado, construído majoritariamente na Primeira República, que forma a paisagem urbana de quatro Áreas de Proteção do Ambiente Cultural (APACs), promulgadas pela Prefeitura, cobrindo cerca de 450 hectares equivalentes a, aproximadamente,  70%  da área do Centro.

4.     O trabalho termina com a confrontação vigente do patamar e da natureza da proteção dos imóveis tombados e das APACs do Centro do Rio, com os conceitos adotados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), nos casos específicos das cidades históricas e, também, com os parâmetros que embasaram a proposta de elevação da cidade à condição de Patrimônio Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), na categoria de Paisagem Cultural. A partir dessa comparação, argumenta, criteriosamente, a possibilidade de o Centro do Rio ser enquadrado como um bem cultural nacional. Propõe ainda, neste mesmo contexto, a inclusão de tal legado no perímetro da referida paisagem cultural mundial.

Breve relato da conservação de áreas urbanas no Brasil

5.     O percurso da conservação de áreas urbanas reflete a trajetória da flexibilização da escala de valores que amplia os horizontes da proteção do patrimônio cultural. No começo, por volta do fim do século XVIII, a partir da criação da legislação francesa, conforme sugere Françoise Choay (2000), as inciativas de conservação se restringiram aos monumentos com atributos históricos e artísticos excepcionais. Ao longo do século XIX, alguns escritores do Romantismo, com destaque para Victor Hugo, defenderam a valorização das peculiaridades do ambiente construído da cidade tradicional, sobretudo na Idade Média. No âmbito das reflexões urbanísticas, Camilo Sitte, nesse mesmo período, ressalta a importância das lições da história na definição do modelo ideal de cidades. Durante o século XX, a partir dos trabalhos de Gustavo Giovannoni, na década de 1910, as áreas urbanas foram definitivamente enquadradas na política de proteção do patrimônio cultural. Giovannoni também transpôs a visão universalista dos monumentos na consideração da importância das obras modestas na composição dos conjuntos arquitetônicos com potencial de proteção.

6.     A relativização do papel das áreas urbanas na conservação do patrimônio cultural avançou consideravelmente a partir da criação de legislações específicas, com destaque para a Lei Malraux, de 1962, da França, e do Civic Amenities Act, do Reino Unido, de 1967. Entretanto, a ampliação da compreensão dos limites da definição de áreas urbanas aprimorou-se significativamente na Carta de Petrópolis, documento do Primeiro Seminário Brasileiro para a Preservação e Revitalização de Centros Históricos, organizado em 1987 pela sessão brasileira do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios - Icomos Brasil. Na visão desse documento, “toda a cidade [todas as partes dela, independente do momento em que foram feitas] é um organismo histórico” (CURY, 2000, p.285).

7.     A conservação de áreas urbanas no Brasil vem se estruturando gradativamente ao longo da trajetória da conservação do patrimônio cultural do país. Avançou-se muito no que foi observado anteriormente na escala mundial, mas ainda persistem situações que desconsideram determinados casos com potencial significativo de proteção, conforme será abordado a seguir.

8.     O reconhecimento de áreas urbanas como patrimônio cultural no Brasil inicia-se antes mesmo da criação da primeira legislação de proteção (Decreto-lei nº 25, de 30/11/1937) e do órgão de tutela dos bens protegidos (o SPHAN, atual IPHAN, no mesmo ano), quando a cidade de Ouro Preto foi elevada à categoria de “monumento nacional” pelo Decreto-lei nº 22.928, de 12/7/1933. Quatro anos depois, o Governo Federal - única instância de proteção naquela época - promoveu o tombamento de diversos bens culturais, concentrando-se em edificações, conjuntos arquitetônicos e algumas cidades (na realidade, trechos das respectivas partes centrais, notadamente dos núcleos históricos). Nesse primeiro momento, tanto a experiência isolada de Ouro Preto como as demais posteriores cidades rotuladas de “históricas” (Tiradentes, Diamantina, Salvador etc.) não foram compreendidas como ambientes construídos, diversificados e abrangentes, mas percebidas como cidades-monumento, sustentadas pelos argumentos das excepcionalidades artísticas e históricas. Valorizava-se nessa ocasião, principalmente, o legado do Período Colonial justificado especialmente pela construção de uma visão de identidade nacional, que coincidiu com a consolidação do Estado brasileiro a partir da Revolução de 1930.

9.     De 1937 até o fim da década de 1960, período denominado na literatura especializada como “Fase Heroica” - durante a Gestão de Rodrigo Mello Franco de Andrade no IPHAN -, o governo federal tombou várias “cidades históricas” com os mesmos critérios “lusófilos” apontados anteriormente. No Rio de Janeiro, Vassouras é a primeira “cidade histórica” do século XIX tombada, em 1958, sem fazer parte do Período Colonial. Brasília, construída no século XX, foi protegida no ano de 1990. Essa cronologia confirma a rejeição histórica da política de proteção em relação ao chamado Período Eclético da virada do século XIX para o XX, da mesma forma como fizeram os defensores dos movimentos Neocolonial (especialmente, José Mariano Filho) e Modernista (todos os expoentes em geral, incluindo aqueles que atuaram em órgãos de tutela do patrimônio cultural e publicaram sobre a história da arquitetura).

10.   No fim da década de 1960, iniciou-se a mudança de paradigmas da conservação de áreas urbanas no Brasil. Visava-se especialmente às ameaças que pairavam sobre os espaços com potencial de proteção em função do modelo desenvolvimentista que se implantou no país na década anterior. As renovações urbanas, as “febres viárias”, a ascensão da indústria automobilística e outros fatores embasaram políticas urbanas que arrasaram bairros e conjuntos arquitetônicos tradicionais e marginalizaram os demais casos já protegidos. Por conta desses fatores, o Governo Federal, por meio do IPHAN, solicitou assessoria da Unesco para conter os efeitos dessas ações. O primeiro a chegar ao país foi Michel Parent, em 1966, cujo relatório foi recentemente publicado pelo IPHAN, em 2009. Em seguida, vieram os arquitetos Viana de Lima, Limburg Stirum e Graeme Shankland, que elaboraram diretrizes urbanísticas para as cidades de Ouro Preto, Paraty e Salvador (Pelourinho), respectivamente. Esses trabalhos serviram de referência para várias outras “cidades históricas” em diversas regiões do país. Entretanto, convém destacar ocorrência de conflitos entre conservação (parâmetros estabelecidos pelo IPHAN) e desenvolvimento (das políticas urbanas das prefeituras envolvidas). Essas experiências motivaram a realização do Programa Cidades Históricas (PCH).

11.   O PCH começou em 1973, inicialmente concentrando-se na Região Nordeste. Foi concebido por um grupo interministerial que abrangia a Secretaria de Planejamento da Presidência da República (Seplan) e os ministérios da Educação e da Cultura, do Planejamento, do Interior e da Indústria e Comércio, com contrapartidas de governos estaduais e prefeituras. Tratava-se de uma ação interdisciplinar, cuja prioridade era a dinamização econômica das localidades envolvidas, especialmente por meio de atividades ligadas, direta ou indiretamente, ao turismo. Apesar da denominação de abrangência urbana (de cidades históricas), concentrava-se, na realidade, em edificações de caráter monumental e conjuntos arquitetônicos restritos, majoritariamente construídos no Período Colonial. A ideia era provocar um efeito cascata a partir de intervenções pontuais que acabaram, na realidade, concentradas no entorno imediato dessas referências. Dois anos depois, o projeto estendeu-se para a Região Sudeste. Neste contexto, uma nova leva de consultores da Unesco foi enviada ao Brasil entre 1976 e 1979 para dar suporte às atividades do PCH. Na mesma ocasião, um grupo de técnicos brasileiros foi encaminhado para qualificação no International Centre for the Study of the Preservation and Restoration of Cultural Property/ICCROM.

12.   De 1973 a 1979, o PCH elaborou 93 projetos, dentre os quais apenas 53 foram executados (SEPLAN, 1979). Quarenta deles estavam em andamento quando as atribuições do Programa foram transferidas, em 1979, para o SPHAN/Pró-Memória. É importante destacar a mudança de critérios de conservação adotados nesse órgão a partir daí. Os aspectos sociais passaram a ser considerados nas intervenções em áreas urbanas protegidas, sobretudo seus impactos nas vidas dos moradores dessas localidades, conforme orienta a Exposição de Motivos 320, de 1979 (SPHAN/Pró-Memória, 1980, p. 154). Relevante também é considerar a ampliação dos indicadores de proteção (menos elitistas e centralizados) na gestão de Aluísio Magalhães (1979-1982), especialmente com a incorporação dos trabalhos do Centro Nacional de Referência Cultural - em atividade de 1975 a 1979. Essas mudanças inserem-se no contexto da abertura política, promovida pelo governo a partir da pressão social pelo fim da Ditadura Militar, no fim da década de 1970 - e, assim como o próprio período ditatorial, foram extintas mais tarde, em 1985. Entretanto, em termos de proteção de áreas urbanas, observa-se, ainda, a concentração de tombamentos de bens culturais do Período Colonial, excetuando-se os casos de Mocugê (Bahia) e Antônio Prado (Rio Grande do Sul), ambos consolidados nas décadas de 1850 e 1880.

13.   A década de 1970 marca a era do “Milagre Econômico,” que representa o apogeu da Ditadura Militar. Essa expansão econômica significativa do país teve impactos consideráveis na configuração urbana das principais metrópoles brasileiras, que se expandiram expressivamente em termos territoriais e populacionais. Testemunhou-se a renovação urbana de várias localidades, muitas delas situadas nas partes centrais e periferias imediatas - com potencial de proteção relevante -, que não foram contempladas pela política de conservação dos governos federal, estaduais e municipais. A instância regional (dos estados) consolidou-se ao longo desse período e reproduziu, quase que integralmente, os instrumentos (tombamento) e os critérios de proteção (das excepcionalidades artísticas e históricas) da esfera federal apontados anteriormente. Na tentativa de compatibilizar desenvolvimento com conservação, o Conselho Nacional de Regiões Metropolitanas (CNPU) recomendou, em 1974, a adoção dessa estratégia nas elaborações de políticas urbanas. Objetivou-se, especialmente, salvaguardar as áreas que sobreviveram às demolições e desfigurações expressivas. A adoção dessa medida pelas autoridades regionais e locais foi tímida e restringiu-se a alguns casos, abordados a seguir.

14.   Em 1978, a conservação de áreas urbanas foi tema de importante evento organizado por SPHAN/Pró-Memória, que trouxe para a cidade do Rio de Janeiro o arquiteto Jean-Bernard Perrin. Ele fez uma relevante palestra sobre a experiência francesa da Lei Malraux, abordando o exemplo da conservação do Bairro da Marais, em Paris, finalizado dois anos antes. Trata-se de um caso paradigmático, controvertido e bastante questionado na literatura especializada, que se converteu no ponto de partida de várias abordagens críticas da questão da gentrificação (KAIN, 1981, p. 221). A exposição de Perrin introduziu a discussão de vários temas acerca do patrimônio cultural pertinentes ao contexto brasileiro. A integração da conservação com os modelos de desenvolvimento urbano, conforme tentativa da CNPU, exposta anteriormente, e os mecanismos de financiamento do plano de conservação francês despertaram o interesse dos participantes do evento em função da ausência de experiências similares na conjuntura brasileira. Os anais do encontro foram publicados posteriormente por SPHAN/Pró-Memória (1980).

15.   Na sequência das recomendações da CNPU e do evento de Perrin, a prefeitura do Rio de Janeiro elaborou e publicou, em 1977, o Plano Urbanístico Básico do Rio, conhecido como “PubRio,” no qual recomendava a proteção da área central da cidade. No ano seguinte, a Fundação Desenvolvimento Região Metropolitana do Recife (FIDEM) realizou um trabalho pioneiro de inventário da Grande Recife, que serviu de parâmetro para a criação, em 1981, da legislação de proteção de áreas urbanas da capital. Na mesma ocasião, a Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (FUNDREM) catalogou o universo de bens culturais da cidade, usando a metodologia do inventário desenvolvida pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro (INEPAC) - inspirada, por sua vez, em uma adaptação feita pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural da Bahia (IPAC), em 1978 sobre a ficha sumária do Conselho Europeu (DAIFUKO, 1972). A partir dessa iniciativa, foram publicados os levantamentos das cidades de Petrópolis e Itaboraí, ambos em 1982, e de Magé, em 1984. Tanto no caso da FIDEM como no da FUNDREM, as propostas de proteção restringiram-se ao tombamento pontual de edificações.

16.   As legislações municipais específicas, surgidas a partir de 1971, em Curitiba, consolidaram a conservação de áreas urbanas no Brasil e permitem um novo olhar para situações antes marginalizadas na política de conservação do patrimônio cultural do país. Os casos do Corredor Cultural no Rio de Janeiro, em 1979, e dos Sítios Históricos de Recife, em 1981, já citados, produziram reflexões que serviram de base para que outras cidades seguissem o mesmo caminho. Por conta dessas referências, o Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM) promoveu, em 1984, um encontro durante o qual se traçou um importante painel das políticas de conservação municipais. Conforme observado na ocasião, a experiência do Rio de Janeiro afirmou-se como paradigma nacional.

17.   O Corredor Cultural é o precursor da proteção de áreas urbanas da prefeitura do Rio. Nele, foram desenvolvidos critérios de conservação de edificações adotados por várias ações nacionais similares, por meio de literatura publicada pelo escritório técnico do projeto - em atividade de 1979 a 2000. Destaca-se neste universo Corredor Cultural: como recuperar, reformar ou construir seu imóvel, de 1985, conhecido como Manual do Corredor Cultural. Nessa publicação, percebe-se a aplicação incondicional do controvertido fenômeno mundial do “fachadismo” (conforme RICHARDS, 1994) e do “coberturismo” (SAMPAIO, 2004). Porém, o Corredor Cultural não reverteu as incompatibilidades das legislações urbanísticas e edílicas vigentes com a conservação do Centro do Rio, que ocorreu somente na década de 1990. E, da mesma forma, não resolveu duas grandes contradições ainda presentes no local: as discrepâncias entre o estado de conservação de fachadas, coberturas e interiores e as desconexões entre as vitalidades dos pavimentos térreos e superiores das edificações protegidas.

18.   A proteção da Zona Portuária - dos bairros de Saúde, Gamboa e Santo Cristo (SAGAS) - avançou na interação entre desenvolvimento (novos empreendimentos e renovações urbanas) e conservação (integridade e autenticidade do conjunto arquitetônico protegido). Teve como outro marco a participação dos moradores na definição dos parâmetros arquitetônicos e urbanísticos do Decreto nº 5.459, de 1985. Esse criou a área de proteção do ambiente cultural (na ocasião, denominada de área de proteção ambiental) do Sagas (iniciais dos bairros abrangidos). O envolvimento das associações de moradores de outros bairros (Santa Teresa, Cidade Nova, Urca, Bairro Peixoto etc.) colocou o Rio na vanguarda da conservação de áreas urbanas. O SAGAS foi usado como referência para a criação das demais APACs e do seu decreto de regulamentação (Decreto nº 7.612, de 1987), que protegeu conjuntos arquitetônicos cronológica e tipologicamente diversificados, repletos de significados históricos, artísticos e afetivos que transcendem a representatividade local. Esses princípios foram incorporados no Plano Diretor de 1992 e mantidos na versão vigente, de 2011, marcando a diferenciação entre APAC (ambiente construído) e APA (ambiente natural), e criando novos instrumentos de salvaguardas: áreas de especial interesse urbanístico (AEIU), áreas de proteção ambiental e recuperação urbana (APARU) etc. No Plano Diretor de 2011, inclui-se, ainda, o conceito de paisagem cultural, inspirando em orientação federal (Portaria nº 127 do IPHAN, de 2009), e no processo de inserção da cidade na lista de Patrimônio Mundial da Unesco, que ocorreria em 2012.

19.   A relativização dos parâmetros de conservação de áreas urbanas no Brasil, observada na década de 1980, foi fundamental para a realização do encontro do Icomos Brasil em Petrópolis, em 1987, tratando da preservação e revitalização de centros históricos. O documento final do evento, porém, alarga a questão da centralidade e propõe a visão da cidade como um todo histórico, conforme indicado anteriormente. Amplia também o tradicional olhar histórico, incluindo as forças sociais que produziram as áreas e estão presentes em seu cotidiano. Propõe, ainda, a inserção da conservação nas políticas urbanas, valorizando, especialmente, a polifuncionalidade, com ênfase na moradia, tendo em vista o déficit habitacional brasileiro. De acordo com Jukka Jokilehto (1996), a Carta de Petrópolis transcendeu os domínios nacionais e transformou-se em uma das principais referências da conservação de áreas urbanas na literatura especializada de conservação.

20.   A partir da década de 1990, o Governo Federal, por meio do IPHAN, participou do Projeto Monumenta, em conjunto com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e prefeituras. O programa teve como objetivo, em longo prazo, conservar áreas urbanas para torná-las autossustentáveis, independentes de recursos públicos a fundo perdido.  Em curto prazo, o Monumenta propôs otimizar o uso das estruturas físicas e econômicas das áreas de interesse.

21.   O cumprimento dos objetivos do Monumenta teve como suporte a criação de um fundo de conservação, previsto no orçamento dos convênios firmados, para supostamente financiar, de forma inédita, obras em edificações particulares. Uma das principais críticas ao programa recai no retorno dos empréstimos. As áreas centrais das cidades de grande porte estão historicamente afetadas por perdas consideráveis de vitalidades urbana e econômica. Em alguns casos, os locais onde se concentram as edificações protegidas de interesse para o programa estão ocupados por segmentos sociais de baixa renda. Na década seguinte, em 2003, embalado pelos resultados parciais do Monumenta, o IPHAN elaborou e publicou o Plano de Preservação de Sítios Históricos Urbanos. Esse se constitui em importante referência sobre o tema, incluindo aspectos conceituais e metodológicos; entretanto, o documento é pouco citado na literatura especializada.

22.   Apesar da trajetória das discussões sobre conservação de áreas urbanas no Brasil, apresentada ao longo deste tópico, o Governo Federal, por meio do IPHAN, não transformou a área central da Cidade do Rio de Janeiro em patrimônio cultural nacional. Ignorou, assim, a existência do processo federal 1.499-T-02, de 18/10/2002, que propõe o tombamento do "Centro Histórico da Cidade do Rio de Janeiro, Estado do Rio de Janeiro," considerado, na ocasião, prioritário pela Superintendente Regional (6ª SR).

23.   O processo ainda se encontra em fase de instrução. Ficou parado de 2005 até 2014, quando foi encaminhado para a atual técnica do IPHAN-RJ, responsável por essa instrução. Nesse período, foi incorporado ao processo um pedido de tombamento do Beco das Garrafas, logradouro situado entre as Ruas São José e Rosário, solicitado por pessoa física, em 27 de dezembro de 2005. Ainda em 2014, a coordenação técnica encaminhou informalmente o documento para outra arquiteta, cujo parecer alerta para a complexidade do tema e as dificuldades de desenvolvimento de estudos necessários à viabilidade da proposta. Na mesma instrução, são citados o acúmulo de outros processos de tombamentos e a exiguidade de corpo técnico capacitado para dar conta de tal tarefa. Da mesma forma, foram feitos questionamentos em relação à indefinição do que seria o “Centro Histórico do Rio” e seu respectivo perímetro de abrangência. Por fim, rebateu-se a integridade da área central da cidade, em função das diversas modificações definidas como inadequadas e contraditórias em relação aos aspectos originais de fases históricas anteriores. E também a ausência de restrições às futuras ocupações que, porventura, descaracterizassem o tecido urbano, sobretudo ao entorno de bens tombados.

24.   Convém destacar que a realidade atual do Centro é bastante oposta ao quadro traçado neste parecer em função da existência de quatro APACs, que cobrem cerca de 70% da extensão do local e incluem a proteção de cerca de 4 mil imóveis relativamente caracterizados e íntegros, abordados adiante. Importante também ressaltar que o próprio IPHAN já conduziu processos de tombamentos de áreas urbanas complexas com equipes técnicas reduzidas, priorizando a pertinência, consistência, coerência e precisão das informações que balizaram tais iniciativas.

25.   A ausência da proteção do Centro do Rio em uma escala nacional foi justificada pelos consultores da Unesco para não incluí-lo no perímetro listado como Patrimônio Mundial em 2012, tanto na zona de proteção como na de amortecimento. E isso se deu mesmo com a presença das APACs criadas pela prefeitura, no fim da década de 1970 e ao longo da de 1980, e a existência no local de uma infinidade de bens tombados nas esferas nacional, estadual e municipal. Um destes bens, o Palácio da Cultura - antiga sede do Ministério de Educação e Saúde, tombado pelo IPHAN em 1948 -, foi incluído em 1996 na lista indicativa para transformá-lo em patrimônio mundial. A maioria dessas edificações forma um conjunto arquitetônico paradigmático de uma importante fase histórica do país.

As três paisagens urbanas do Centro do Rio e seus núcleos itinerantes

26.   Na formação do Centro do Rio de Janeiro, percebeu-se, ao longo do tempo, a sucessão de três paisagens urbanas que se contextualizam no exuberante cenário natural da cidade, notabilizado pela relação intrínseca entre mar, lagoas e montanhas dispersas por três maciços. A primeira vincula-se aos primórdios da fundação da cidade, perpetuando-se ainda por todo o Período Colonial (século XVI ao início do século XIX) e parte do Imperial (1822-1889) [Figura 1a]. A segunda paisagem moldou-se especialmente na Era Republicana, notadamente na fase denominada Primeira República, do fim da década de 1890 à Revolução de 1930 [Figura 1b]. A última delas coincide com a renovação urbana de trechos da área, iniciada a partir da década de 1940, fundamentada nos cânones das cidades modernas preconizados pela Carta de Atenas de 1933 [Figura 1c].

27.   A paisagem inicial foi gradativamente modificada no decorrer da segunda metade do século XIX até as grandes reformas do prefeito Pereira Passos, no início do século seguinte, nos moldes das intervenções parisienses de Georges-Eugène Haussmann. Restaram, do Centro do Rio Colonial, poucas edificações de caráter monumental desprovidas do contexto urbano da época. Imagens remanescentes do Brasil desse período concentram-se em cidades de médio e pequeno porte, localizadas majoritariamente no interior do país. Muitas delas foram protegidas como bens culturais de representatividade nacional. Algumas, como Ouro Preto, Olinda e São Luiz, são consideradas Patrimônio Mundial pela Unesco. Salvador, a área denominada como Pelourinho, é uma exceção em termos metropolitanos.

28.   A paisagem subsequente se impôs na égide de Pereira Passos, o “Haussmann Tropical,” conforme definido na dissertação de mestrado, posteriormente publicada, de Jaime Benchimol (1992). As feições arquitetônicas do Rio do Prefeito Passos são do Período Eclético, com conceitos predominantemente classicizantes baseados em soluções originais da linguagem Clássica da Antiguidade (Grécia e Roma), Renascimento, Maneirismo, Barroco e Neoclássico. São mescladas, ainda, em segundo plano com inserções de elementos decorativos da Arquitetura Medieval Europeia (Românica e Gótica), de contribuições de culturas tradicionais de outros continentes (egípcia, indiana, chinesa etc.) e Art Nouveau. Apresentam repertórios compositivos sofisticados, diversificados e injustamente acusados de falta de originalidade [Figura 2]. O cenário representa, além disso, um importante momento da história brasileira, da transição da sociedade patriarcal para a urbana. Foi uma tentativa de se apagar uma herança colonial escravocrata, fundamentando-se nos ambientes burgueses europeus, sobretudo nos estabelecimentos culturais e comercias, e em moradias de Paris. É a maior obra e o maior investimento do país daquela ocasião [Figura 3].

29.   Como consequência, o Rio, especialmente o seu Centro, transforma-se em um paradigma nacional, no cartão-postal de uma nova e emergente nação dita capitalista. O conjunto arquitetônico remanescente dessa segunda paisagem é repleto de edificações de diferentes significações ambientais, de notáveis méritos e de valor de conjunto não tão distante dos atuais padrões de habitabilidade. Predomina neste universo um grupo de sobrados contextuais e modestos com repertório estilístico descrito, construído majoritariamente por mestres de obras portugueses, que usavam como referência principal, segundo sugere Pedro Alcântara (1981) e Dora Alcântara (1984), a Biblioteca de Instrução Profissional, publicada simultaneamente no Brasil e em Portugal nas quatro primeiras décadas do século XX. O conjunto de sobrados estende-se por cerca de 450 hectares que equivalem aproximadamente a 70% da área do Centro, concentrando-se nas APACs do Corredor Cultural, Cruz Vermelha, do Entorno do Mosteiro de São Bento (antiga Teófilo Otoni) e parte de Saúde, Gamboa e Santo Cristo (SAGAS), que, juntas, possuem em torno de 4 mil edificações protegidas, predominantemente compostas pelos sobrados supostamente inspirados na Biblioteca de Instrução Profissional.

30.   As legislações que regulavam as reformas e construções na parte central do Rio, de 1892 a 1922, determinavam que os prédios construídos fossem de, pelo menos, um sobrado, que se constituía em um gabarito que não prejudicava a leitura do skyline dos morros próximos (Santa Teresa e Zona Portuária) e distantes do local (Serra da Carioca e Pão de Açúcar). O Decreto nº 391, de 10/2/1903, na gestão do Prefeito Pereira Passos, sugere que esse termo se aplica às edificações de mais de um pavimento. Vários pesquisadores também compreendem a definição dessa maneira, como são os casos de Dora Alcântara (1984), no seu trabalho sobre o conjunto arquitetônico da Praça XV, e Pedro Alcântara (1981), a respeito da Saara. O Escritório Técnico do Projeto Corredor Cultural, nas suas publicações, indica sobrado da mesma forma.

31.   Do ponto de vista programático, esses sobrados são originalmente de uso misto, com unidades residenciais unifamiliares e/ou multifamiliares nos pavimentos superiores e com estabelecimentos comerciais nos térreos. A gradativa redução do uso residencial do Centro do Rio, ao longo do século XX, provocou mudanças nas compartimentações das partes elevadas desses prédios, as quais se transformaram em áreas de estocagem comerciais. Estas, por sua vez, vêm diminuindo paulatinamente por conta da subutilização desse trecho da cidade.

32.   Os sistemas construtivos dos sobrados são bastante complexos e significativos. Representam um elo que conecta as técnicas adotadas no Período Colonial com os atuais padrões construtivos. Precisam ainda ser mais compreendidos e valorizados do ponto de vista tipológico e simbólico na política de proteção de bens culturais do país, sobretudo da Cidade do Rio de Janeiro.

33.   Um dos itens de maior visibilidade desse conjunto arquitetônico, as fachadas principais, são marcadas do ponto de vista construtivo por um universo de requintados ornamentos e modenatura em estuque. Sofisticados trabalhos de cantarias em gnaisse e minuciosas serralherias em ferro fundido completam a composição estilística destacada [Figura 4a e Figura 4b]. Sobressaem-se nesse repertório decorativo esquadrias de madeira com soluções diversificadas de venezianas, panos de vidros (alguns jateados e/ou bisotados) e bandeiras feitas dominantemente com pinho de riga. Em escala menor, disponibilizam-se painéis de azulejos aplicados nos acabamentos de alvenarias e preenchimentos de molduras. Todo esse conjunto se insere em uma escala cromática variada (policrômica), que valoriza o papel do elemento arquitetônico na composição estilística. Os estuques e planos de alvenarias se revestiam, originalmente, por tintas à base de cal e as esquadrias de madeira e serralheria, com tinta óleo. Cantarias eram mantidas nas suas condições naturais.

34.   Outros itens relativamente visíveis no contexto urbano são as coberturas, portadoras de morfologias intrincadas, definidas, na maioria dos casos, por quatro águas revestidas por telhas de barro francesas industrializadas, importadas e intercaladas por telhas ventiladoras denominadas “Paula Cândido” pelas legislações já comentadas. Todo esse conjunto se sustenta por estruturas definidas por peças de madeiras processadas, predominantemente de pinho e pinho de riga. No meio das coberturas, se posicionam claraboias compostas por caixilhos de ferro preenchidos com vidro. Tais claraboias arrematam-se nas laterais por venezianas de madeira que serviam para iluminar e ventilar os compartimentos internos centrais determinados pelas legislações da época. As águas pluviais conduziam-se por calhas metálicas embutidas nas alvenarias.

35.   Nos interiores, nota-se que as ornamentações não são tão exuberantes em relação às fachadas principais e se resumem nos acabamentos de paredes divisórias e das alvenarias laterais. Mesmo assim, ainda se percebem requintados conjuntos de modenaturas em gesso e/ou estuque (em menor escala), que fazem as transições das elevações com os tetos. Apreende-se, da mesma forma, uma relativa sofisticação de carpintarias e marcenarias, especialmente nos casos de pisos, forros, escadarias, balaustradas e esquadrias. Observam-se, em alguns casos, a presença de azulejarias (determinadas por lei por questões higiênicas) em corredores e, principalmente, cozinhas e banheiros, os quais possuem obrigatoriamente pisos compostos por depurados mosaicos de ladrilhos hidráulicos. Nesses últimos, surgem peças sanitárias esmaltadas e/ou metálicas, também disponibilizadas em catálogos de serralheiros estrangeiros (destaque para Walter MacFarlane, principal exportador para o Brasil, segundo SILVA, 1986) com as demais peças citadas das fachadas e coberturas. No entanto, a presença de pinturas parietais não é comum.

36.   Em termos de salubridade - uma inovação no padrão construtivo brasileiro até aquele momento -, além das determinações de ventilação e de iluminação, os sobrados contavam com instalações hidráulicas (águas frias, pluviais e esgoto), cujos dutos eram compostos por encanamentos de chumbo e/ou ferro fundido. Essas instalações prediais eram completadas pela elétrica em substituição à iluminação à base de óleo, querosene, vela e gás (em uma escala menor), especialmente a partir do início do século XX.

37.   Todas as novidades no cenário arquitetônico brasileiro desse período finalizaram-se nas inovações percebidas nos esquemas estruturais. Nas tradicionais alvenarias autoportantes, herdadas dos Períodos Colonial e Imperial, inseriram-se contraventamentos, amarrações, vigas (de diversos tipos de perfis), colunas (reproduções das clássicas, sobretudo das ordens coríntia e compósita, as mais rebuscadas delas) e abobadilhas metálicas de ferro fundido. Pode-se, nesse caso, fazer uma analogia com a citação de Bruno Zevi (1978, p. 65) sobre os avanços estruturais do Românico quando o autor cita que a arquitetura deixa de agir em termos de pele (paredes portantes) e se exprime em termos de ossaturas (sistema pisos-vigas-pilares). Tal fato vai se concretizar posteriormente na adoção, em larga escala, do concreto armado a partir da década de 1920 e da popularização das estruturas de aço na década de 1950 em diante. Convém destacar, ainda, no contexto estrutural, a inserção de pisos de concreto nos compartimentos ditos molhados (cozinhas e banheiros). Entretanto, nas paredes divisórias da compartimentação usavam-se tabiques compostos por tramas de madeiras aparelhadas preenchidas por saibro (que lembram o tradicional sistema de pau-a-pique), com o objetivo de aliviar os respectivos carregamentos (pesos próprios) sobre os pisos de madeira sustentados por barroteamentos do mesmo material.

38.   Entre a segunda e a terceira paisagens poderia ter acontecido outra, imposta por um plano de remodelação da cidade, de autoria de Alfred Hubert Donat Agache, contratado pela prefeitura do Distrito Federal na gestão de Antônio Padro Júnior, nomeado por Washington Luís, de 1926 a 1930, último presidente ligado à oligarquia da Primeira República. O plano, segundo Vera Rezende (1982, p.40), é, no âmbito ideológico, uma concessão da oligarquia à parte da burguesia industrial, que já se aproxima do poder e habita a cidade, empreendendo as mudanças necessárias ao desenvolvimento urbano e sua adequação ao sistema capitalista. O Plano Agache [Figura 5], como ficou conhecido, limita-se à estruturação física territorial da cidade. De inspiração acadêmica, monumental, o plano também apresenta preocupação com aspectos funcionais da cidade. Estilisticamente, aproxima-se do Art Decó em termos de desenho urbano. Promoveria uma total reestruturação da parte central da cidade. Entretanto, foi abortado e abandonado pela Revolução de 1930. Porém, influenciou alguns parâmetros edilícios e urbanísticos, de uso e de ocupação (traçado viário, pátios centrais de quadras, galeria de pedestres sustentada por pilotis etc.), contidos especialmente no Decreto nº 6.000, de 1937, que vigorou até 1970, quando foi revogado pelo Decreto nº 3.800. A influência do Plano Agache ainda pode ser percebida em outras cidades brasileiras.

39.   Esta imagem eclética dos sobrados contextuais/modestos, ao lado das edificações de notáveis méritos - diversificada, original, até então cosmopolita e tão repleta de conteúdos culturais e sociais -, resistiu consideravelmente ao processo de modificação imposto pelo terceiro panorama edilício e urbanístico do Centro do Rio, que se contextualiza nas drásticas cirurgias urbanísticas das renovações das metrópoles brasileiras, na década de 1950 em diante, que renovaram cerca de 30% do Centro nos trechos das áreas centrais de negócio I e II, definidas especialmente pelo Decreto nº 322, de 1976 - uma das legislações que mais estimulou a especulação imobiliária na cidade, revogado apenas em 1994. Ainda luta contra um esvaziamento histórico de moradores, atividades comerciais e serviços, abordado adiante.

40.   A formação dessas três paisagens citadas ocorreu ao redor de quatro pontos de convergência que se caracterizaram, na realidade, por centralidades distintas correlacionadas com as fases históricas comentadas [Figura 6]. De acordo com Raquel Sisson (1986), o ponto de irradiação inicial da evolução urbana do Centro do Rio se deu a partir dos primórdios da cidade, no século XVI, no topo do Morro do Castelo. Ainda no Período Colonial, esse ponto deslocou-se para a Praça XV, ao redor da Casa dos Governadores e Vice-Reis, convertido no Paço Real com a vinda da Família Real Portuguesa em 1808 e, posteriormente, no Paço Imperial, em 1822. No Período Imperial, o ponto focal mudou-se para o Campo de Santana, superado pela Cinelândia na Primeira República. O primeiro “centro” foi completamente demolido em 1922 e os demais se encontram, hoje, relativamente preservados, em três das quatro subáreas que formam a APAC do Corredor Cultural.

41.   A comovente resistência do ambiente urbano tradicional do Centro do Rio (que abrange as áreas anteriormente mencionadas), dos exemplares que sobraram do Período Colonial e, de maneira especial, do Período Eclético, altamente peculiar - mesclados por contribuições significativas de manifestações arquitetônicas posteriores pontuais, Art-Decó, Protomodernas e Modernistas -, já se encontra salvaguardada pela política de proteção das APACs da prefeitura. Porém, as destacadas representatividades históricas, artísticas, culturais e afetivas desse legado transcendem as fronteiras locais. Em termos qualitativos e quantitativos, somado às áreas periféricas e limítrofes protegidas da Zona Portuária (SAGAS), dos bairros de Santa Teresa, da Cidade Nova e do Catumbi - que adicionam mais 2 mil edificações protegidas nesse grupamento eclético contextual -, a parte central do Centro do Rio é o maior exemplar do país no gênero tipologicamente homogêneo, íntegro e razoavelmente preservado.

42.   Sendo assim, esse Centro, principalmente a malha contínua composta pelas APACs em destaque, poderia ser reconhecido como Patrimônio Nacional? Ter o mesmo status simbólico do qual gozam as rotuladas “cidades históricas” do Período Colonial, chanceladas pela instância de proteção federal? Seria a “Cidade Histórica da Primeira República”? Relativizaríamos, dessa forma, a salvaguarda de áreas urbanas no país, baseada em uma visão conceitual mais abrangente, preconizada, por exemplo, pela Carta de Petrópolis? Incluiríamos os citados arredores também? O primeiro e, quem sabe, ambos os casos fariam parte do perímetro da área listada como Paisagem Mundial pela Unesco, que tangencia todas estas localidades? Corrigiríamos, assim, esses lapsos da política de proteção do patrimônio cultural do país?

Condições atuais do centro do Rio de Janeiro

43.   A Cidade do Rio de Janeiro localiza-se na segunda maior região metropolitana brasileira. De acordo com Maurício Abreu (1987, p. 18), integra-se em uma estrutura territorial radial, composta por um núcleo cercado por periferias imediata, intermediária e distante. O núcleo deste esquema engloba a parte central da cidade de Niterói, o Centro do Rio e bairros periféricos que se estendem da Zona Portuária até a Zona Sul da cidade (Copacabana, Ipanema, Leblon etc.), passando por um trecho da Zona Norte (Tijuca, Rio Cumprido, Vila Isabel, São Cristóvão etc.). Nesse núcleo, em especial a parte central do Rio, agrupam-se o que há de melhor em termos de infraestrutura urbana. Nos bairros litorâneos da Zona Sul e da periferia imediata do Rio (Barra da Tijuca e Recreio dos Bandeirantes), concentram-se a maior renda de toda esta região. Tanto a renda como a infraestrutura urbana, segundo os dados dos últimos censos do IBGE (1980, 1991, 2000 e 2010), escasseiam à medida que se dirige do núcleo para a periferia distante, que abrange 19 municípios.

44.   O Centro do Rio engloba a Área Central de Negócios (ACN), envolvida pelas APACs já mencionadas, com cerca de 4 mil edificações protegidas, além das tombadas pelos governos federal e estadual. Predominam na região usos comercial, de serviços e residencial. Este último se restringe a alguns trechos próximos da ACN. Os moradores do Centro, segundo o Censo de 2010, são de classe média e de baixo poder aquisitivo. Possuem renda que varia de 1 a 5 salários mínimos.

45.   A conformação atual do Centro do Rio é fruto de um longo processo de segregação bastante analisado nos trabalhos de investigação urbana (VALLADARES e COELHO, 1996, p. 120). Flávio Villaça (1998, p. 142) afirma que ¬a contradição entre centro e periferia é o padrão mais conhecido da segregação urbana das metrópoles brasileiras.” Esta segregação origina-se na disputa de determinados espaços das cidades por grupos que representam as estratificações sociais nacionais, regionais e/ou locais. Esses indivíduos lutam pelos melhores locais para residir, trabalhar e se divertir. Lutam, acima de tudo, pelo usufruto do que se tem de melhor em termos de localização, amenidades e infraestrutura urbana.

46.   Os principais atores envolvidos nos diferentes processos de segregação urbana são o Estado, os setores do mercado imobiliário, os grupos hegemônicos (os beneficiados) e os segregados (os menos beneficiados e os mais prejudicados). Esses atores também são descritos como agentes modeladores do espaço urbano. Eles têm diferentes patamares de interferência na definição dos espaços urbanos, que incluem formações e transformações dos conjuntos arquitetônicos, protegidos ou não.

47.   O Estado é o principal promotor dos novos vetores de expansão urbana, das renovações urbanas, responsável por investimentos em infraestrutura urbana (em alguns casos, em parceria com a iniciativa privada) e pela elaboração das políticas urbanas que regulam essas iniciativas. Possui destaque em várias referências básicas, como Jean Lojikine (1981) e Maurício Abreu (1987). Atua em parceria direta e indireta com outros importantes agentes modeladores do espaço urbano, os setores do mercado imobiliário, principais responsáveis pelos mecanismos de especulação imobiliária excludentes.

48.   A trajetória da formação do Rio caracteriza-se, entre outros fatores, pela atuação dos agentes modeladores analisados anteriormente. Esses tiveram participações decisivas na formação e na transformação do espaço urbano da cidade. O Centro foi o palco principal dessas transformações até o esvaziamento econômico local.

49.   Durante o Período Colonial, o Centro do Rio consolidou-se como o ponto de convergência da cidade. Na fase imperial, principalmente na segunda metade do século XIX, a população do Centro inicia seu processo de deslocamento na direção da Zona Sul da cidade, para os bairros da Glória, Catete e Botafogo, conforme relata Maurício de Abreu (1987). O aumento das atividades comerciais, de serviços e a presença cada vez maior da população de baixa renda, que se abrigava em casas de cômodos e cortiços deteriorados, tornaram o ambiente das ruas do Centro insalubre para os padrões habitacionais, na visão dos grupos hegemônicos. Áreas de estoque de lojas e escritórios ocuparam parcialmente as unidades residenciais dos pavimentos superiores das edificações de uso misto, a maioria delas formada pelos sobrados das APACs centrais. Nas residências de grande porte, instalaram-se indivíduos/famílias de baixo poder aquisitivo, transformando-as em casas de cômodos.

50.   Logo em seguida, o Governo Federal e as autoridades locais (do antigo Distrito Federal) iniciaram um projeto para transformar o Rio em cartão-postal da emergente nação capitalista [Figura 7]. O Centro da Cidade era o foco de atenção da Reforma Passos. Na realidade, esta renovação, segundo Carlos Nelson (1980, p. 21), tinha como objetivo “livrar o centro de presenças indesejáveis.” Objetivava-se, também, transformar este local no principal “central business district” (na área central de negócios) do país. Começava, então, o processo de esvaziamento residencial sistematizado dessa região e a implantação gradual do monofuncionalismo, que seria, posteriormente, legitimado do ponto de vista conceitual pelas quatro funções urbanas básicas propostas na cidade moderna ideal da Carta de Atenas de 1933, redigida por Le Corbuisier: habitação, trabalho, recreação e circulação.

51.   Nas gestões seguintes à de Pereira Passos, outros prefeitos deram sequência à remodelação do Centro. Carlos Sampaio, em 1922, demoliu o Morro do Castelo, núcleo histórico da cidade, alegando a insalubridade do Centro (ABREU, 1987, p. 76). Duas décadas depois, a Avenida Presidente Vargas era aberta em direção à Zona Norte, promovendo a demolição e alterações de vários quarteirões, e de bens culturais já tombados pela recém-criada legislação de proteção do patrimônio cultural de 1937 (destaque para a Igreja de São Pedro dos Clérigos, de 1733, e o Campo de Santana, de 1873). Maurício de Abreu (1987, p. 114) cita que 525 edificações ocupadas por indivíduos de baixa renda foram demolidas para a construção da avenida. A implantação de obras viárias de grande porte continuou na década de 1950, com a construção da recém-demolida Avenida Perimetral, que destruiu o antigo Mercado Municipal, na opinião de Geraldo Gomes da Silva (1986, p. 157), um dos melhores exemplos de arquitetura do ferro, “o maior de todos os edifícios de ferro montados no Brasil de origem europeia.”

52.   A febre viária continuou a afetar o Centro ao longo da década de 1960, com a construção (mais tarde, interrompida) da Avenida Norte-Sul, sempre passando por trechos ocupados pela população de baixa renda, como na Lapa, berço da boemia da cidade. A última grande obra viária a cortar o Centro foi o metrô. Existe um consenso nas investigações urbanas do Rio de que essas grandes obras viárias que cortaram o Centro foram feitas para facilitar o acesso ao local dos segmentos sociais de alta renda que pudessem arcar com os custos dos deslocamentos, principalmente nos seus automóveis. Três linhas de “Veículo Leve sobre Trilhos” (VLT) foram incorporadas recentemente no Centro como parte dos grandes investimentos feitos para os megaeventos da Copa do Mundo (2014) e dos Jogos Olímpicos (2016).

53.   A consolidação da eliminação do uso residencial e do monofuncionalismo do Centro ocorreu em 1976, por meio do Decreto nº 322, que regulamentava os parâmetros urbanísticos de uso e ocupação da cidade na ocasião. A restrição era total na Área Central de Negócios 2, nas cercanias do centro financeiro da cidade e tolerada na Área Central 1, nos demais trechos do Centro, próximos à Central do Brasil, Praça Cruz Vermelha, Lapa, Cinelândia etc., onde ainda se pode perceber a presença do uso residencial. O Decreto nº 322, na realidade, consolidou as proibições legais do uso residencial no Centro, que se iniciaram com a restrição às construções de cortiços por Pereira Passos, em 1903. Essa restrição foi revogada em 1994, pela “Lei do Centro” (Lei nº 2.236). Entretanto, apenas um empreendimento de grande porte ocorreu na região, na Lapa.

54.   O deslocamento populacional do Centro formou novos vetores de expansão urbana explorados pelos setores do mercado imobiliário. A concentração de novos empreendimentos imobiliários formou subcentros, que passaram a drenar atividades comerciais e de serviços do Centro, iniciando seu esvaziamento econômico. Flávio Villaça (1998) afirma que o primeiro centro secundário formou-se ao redor da Praça Saens Peña, na Tijuca, por volta da década de 1930. Outros subcentros desenvolveram-se nas décadas seguintes nos bairros de Madureira, Méier e Copacabana. Esse último tornou-se paradigma na cidade em termos de modelo de desenvolvimento urbano. Maria Therezinha de Segadas Soares (1968, p. 127) comenta que

55.                            a metrópole do Rio de Janeiro revela-se, porém, particularmente interessante e digna de estudo nesse setor, pois nela originou-se um subcentro verdadeiramente gigantesco, vários subcentros muito grandes e a tendência atual é para a multiplicação de pequenos subcentros, de caráter nucleado ou alongado, por toda a cidade.

56.   O último subcentro a se formar no Rio é o da Barra da Tijuca, que se enquadra em uma proposta urbanística originalmente desenvolvida por Lúcio Costa no final da década de 1960 e, posteriormente, alterada por pressões do mercado imobiliário.

57.   No início da década de 1970, o Centro e os subcentros passaram a ter concorrência dos shopping centers. Esses grandes complexos comerciais e também de serviços tentam reproduzir o mix comercial dos bairros, porém com algumas vantagens que o comércio de rua não pode oferecer na maioria dos casos, como estacionamento, proteção das intempéries (incluindo climatização), segurança e horário de funcionamento mais extenso, incluindo fins de semana e feriados. Por trás dos shoppings, estão grandes incorporadores e fundos de pensões. O interesse crescente nesses empreendimentos saturou o comércio do Rio.

58.   Usando estratégias comerciais e locacionais semelhantes aos shopping centers, grandes cadeias de supermercados construíram hipermercados, que também tiveram impacto na estrutura comercial da cidade. A capacidade de compra em larga escala e os custos operacionais reduzidos fundamentados no autoatendimento permitem que os estabelecimentos comerciais pratiquem preços no varejo bastante competitivos, atraindo um grande contingente de consumidores. Alguns hipermercados possuem horários de funcionamento mais flexíveis que os dos shoppings, ficando abertos por 24 horas. Convém também destacar o volume crescente do eCommerce (comércio eletrônico via internet) e a ampliação das redes de home offices (escritórios e/ou empresas domésticas), cujas transações aumentam a cada ano, competindo significativamente com as citadas formas físicas de estabelecimentos comerciais e de serviços.

59.   Subcentros, shopping centers, hipermercados e internet não foram os únicos fatores que colaboraram para o esvaziamento das atividades comerciais e de serviços do Centro do Rio. Outros fatores históricos também interferiram neste fenômeno. Talvez o mais importante deles tenha sido a mudança da capital do país, que se encontrava na cidade até 1960, para Brasília. Várias repartições públicas sediadas no Centro deslocaram-se para a nova capital.  Até hoje, o comércio do Centro, segundo os lojistas, ressente-se da perda dessa clientela. Vários edifícios federais encontram-se hoje subutilizados e alguns, vazios. A descentralização que afetou as principais metrópoles brasileiras, conforme relata Flávio Villaça (1998), e o término das operações da Bolsa de Valores do Rio, situada na Praça XV, na década de 1990, também contribuíram para a perda de vitalidade urbana do Centro.

60.   O esvaziamento econômico afetou sensivelmente o movimento dos estabelecimentos comerciais do Centro. As áreas de estoque das lojas, que ocuparam parcialmente as antigas moradias situadas nos pavimentos superiores, encolheram e permanecem vazias. Os fatores econômicos e políticos apontados, muitos deles provocados por iniciativas do Estado (notadamente, a instância local) e dos setores do mercado imobiliário, aumentaram ainda mais as ações danosas da obsolescência física e funcional das edificações afetadas, a maioria delas protegidas.

61.   Os efeitos deste esvaziamento são nefastos para a conservação das edificações tombadas e das APACs do Centro do Rio e podem ser considerados o fator de deterioração que mais compromete a autenticidade e a integridade desses bens culturais. Alguns trabalhos já detectaram parcialmente este fenômeno e suas consequências. Provavelmente, o primeiro deles foi feito pela equipe do arquiteto Pedro Alcântara no contexto dos estudos (pesquisa histórica, cadastramento das fachadas principais e análises tipológicas) da Rua da Carioca, em 1984. Uma das investigações concentrou-se no levantamento esquemático das condições de uso de todos os pavimentos dos sobrados deste logradouro. Percebeu-se, na ocasião, quantidade significativa de espaços ociosos, os quais não foram quantificados.

62.   Na tese de doutorado do autor deste artigo (2002) - que aborda o tema da persistência da subutilização de áreas centrais das metrópoles brasileiras, sobretudo no caso do Rio de Janeiro e, especificamente, do Corredor Cultural -, processou-se um levantamento por amostragem deste problema. Os critérios para seleção das edificações inventariadas fundamentaram-se na escolha de três quadras com a maior concentração de edificações protegidas em cada uma das subáreas de proteção do Corredor Cultural, Praça XV, Largo de São Francisco e Saara. A subárea da Lapa foi descartada porque é um dos locais onde o uso residencial permaneceu no Centro e, de certa forma, contribui para a utilização efetiva das edificações. Cento e trinta prédios compõem a amostragem indicada em um universo de 1.600 edificações protegidas do Corredor Cultural. Noventa e duas delas foram inventariadas, 27 tiveram acesso recusado pelos usuários e 11 estavam desocupadas.

63.   Baseado no critério estabelecido, o inventário arquitetônico da referida tese identificou 35 edificações subutilizadas na seleção estabelecida no ano 2000. Nessas edificações, totalizaram-se 4.280,29 metros quadrados de áreas disponíveis, concentradas na subárea do Largo de São Francisco, na quadra delimitada pelas ruas da Carioca, Sete de Setembro, Ramalho Urtigão e Praça Tiradentes. A reutilização dessas áreas vazias poderia proporcionar a construção de 142 unidades residenciais, tendo em vista a metragem mínima de 30 metros quadrados, determinada pela legislação edilícia vigente na cidade.

64.   O trabalho final de graduação de Carolina Dazzi Machado (2015), que abrange o tema do retorno do uso residencial no Centro do Rio, baseia-se na referida tese, pois usa como universo de trabalho a mesma quadra da subárea do Largo de São Francisco, que possui 63 sobrados. Como Dazzi não teve acesso à totalidade dos mesmos prédios definidos pelo autor deste artigo como subutilizados em 2000, uma comparação entre os dois trabalhos ficaria parcialmente prejudicada. Entretanto, percebeu-se, nesse último levantamento, a persistência da subutilização de alguns imóveis e o aumento significativo dos prédios vazios.

Revendo a proteção vigente

65.   A proposta de proteção do Centro do Rio como Patrimônio Cultural Nacional contribui para o debate da trajetória da conservação de áreas urbanas no país. Incorpora, igualmente, os avanços conceituais e metodológicos discutidos na revisão da literatura especializada sobre o tema em questão, que refletem os consensos alcançados desde a primeira proteção de áreas urbanas, de Ouro Preto, em 1933, até o momento atual. Expande a noção de representatividade local para todo o país. Reforça, ainda, a valorização do Centro, indicada como prioritária pelo Plano Diretor da Cidade, de 2011, e as respectivas propostas de revisão, que se encontram em andamento desde 2018.

66.   A proposta inicial do perímetro de abrangência deste tombamento incorpora a delimitação oficial atual do Centro [Figura 8], reconhecida pela prefeitura do Rio pelo Decreto nº 5.280, de 23/8/1985, que coincide com a II Região Administrativa da Cidade (Centro), equivalente ao núcleo central da Reforma Passos, abrangendo as antigas freguesias da Candelária, São José, Santa Rita, Santana, Sacramento e Santo Antônio, que formavam o Centro do Rio na ocasião. As edificações que comporão o conjunto arquitetônico protegido consagram os tombamentos federais, estaduais, municipais e, especialmente, as proteções homologadas pelas APACs do Corredor Cultural (Lei nº 1.139, de 16/12/1987), Cruz Vermelha (Decreto nº 11.883, de 30/12/1992), entorno do Mosteiro de São Bento (antiga Teófilo Otoni - Decreto nº 24.420, de 21/07/2004) e parte da Saúde, Gamboa e Santo Cristo (SAGAS - Decreto nº 7.351, de 14/01/1988) existentes no referido limite. Estas áreas se transformarão em subáreas de proteção, sem a perda da tutela municipal do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH). Os espaços não protegidos do Centro tombado e as APACs circundantes, do SAGAS (trecho da Zona Portuária), Cidade Nova e Santa Teresa serão consideradas zona de amortecimento. Essas áreas de ambiência são fundamentais para a visibilidade do trecho protegido. A medida cria condições de uso e de impactos ambientais adequados à conservação de toda a localidade e permite zonas de transição entre proteção, renovação urbana e novos empreendimentos nos pontos adequados e pertinentes.

67.   A proposição do tombamento nacional em questão integra o somatório das contribuições arquitetônicas de toda a trajetória histórica local, regional e nacional. Considera, da mesma forma, as manifestações culturais (sobretudo, arquitetônicas, urbanísticas e paisagísticas) das três paisagens urbanas do Centro definidas neste trabalho e das quatro centralidades apontadas por Raquel Sisson (1986). Entretanto, privilegia como diferencial dos tombamentos já realizados no país, a proteção do que pode ser considerado o maior conjunto arquitetônico contextual brasileiro da Primeira República (1889-1930) [Figura 9] - ou seja, a primeira “Cidade Histórica da Primeira República,” parafraseando-se a tradicional denominação do IPHAN para casos análogos do Período Colonial. Esse grupamento de edificações destaca-se pelos sobrados majoritariamente pertencentes ao Período Eclético nacional, com as características já descritas que particularizam o Centro do Rio, mas que também estão presentes em outras partes da cidade, notadamente nas APACs circundantes da parte central, das zonas Norte (São Cristóvão), Sul (Laranjeiras, Catete e Botafogo) e Oeste (Santa Cruz). Define, amplamente, a segunda paisagem do Centro do Rio, da Reforma Passos, paradigma nacional, que se constitui no objeto de especial valorização desse tombamento, em detrimento da visão histórica exclusivamente linear e cumulativa apresentada nas instruções do processo 1.499-T-02.

68.   A legislação urbanística proposta para a área a ser protegida visa endossar e unificar os parâmetros de uso e de ocupação já definidos nos decretos das APACs e nas áreas de entorno dos bens tombados compatibilizando renovação com conservação, de acordo com as experiências relatadas na trajetória da conservação. Propõe, da mesma forma, a revisão da legislação vigente nos trechos da área de abrangência do tombamento não cobertos pelas APACs. A polifuncionalidade será protagonista das proposições de estruturação urbana do local, com ênfase no uso residencial socialmente diversificado (sem privilégios de “hegemônicos” e/ou “segregados”), conforme recomendações da Carta de Petrópolis, que compreende essa estratégia como a medida ideal para reverter processos de esvaziamento urbano idênticos ao detectado no Centro do Rio. De acordo com Andy Coupland (1997), a polifuncionalidade, também denominada de uso misto, é consenso estabelecido em toda a literatura de conservação de áreas urbanas. A APAC do SAGAS, neste caso, é a principal referência em termos de valorização e de proposições do uso residencial. Deve-se levar ainda em consideração a revogação da limitação imposta ao horário do comércio de rua pelas Posturas Municipais. As restrições de funcionamento noturnos, nos fins de semana e feriados, comprometem significativamente a vitalidade urbana do Centro e demais subcentros da cidade.

69.   O desafio da implantação da polifuncionalidade (do uso misto) reside na compatibilização das diferentes exigências de moradores, comerciantes, profissionais liberais, turistas, e assim por diante, conforme destacam Anne Petherick (1992, 1998) e Shankland Cox (1993), que retratam experiências similares no Reino Unido. Outro fato importante são as demandas do uso residencial. Esquemas de criação de áreas residenciais, ou parte delas, não se resumem somente nas construções de moradias. Toda a região deverá ser dotada com amenidades de bairros residenciais, com provisão de equipamentos sociais coletivos, serviços públicos adequados, estímulo ao comércio de rua, acessibilidade, estacionamento de veículos (que poderão ser adequadamente tolerados nos logradouros) e outras atratividades compatíveis com a conservação da área. Convém destacar que o perfil atual do uso residencial remanescente no Centro do Rio é composto, predominantemente, por idosos, casais sem filhos e solteiros. Portanto, esquemas especiais vão se direcionar para esse universo, principalmente para a ocupação das áreas vazias e subutilizadas [Figura 10]. Os resultados das ações das Housing Associations Britânicas, em parceria com as universidades, são emblemáticos, assim também como o projeto Living Over the Shops, da Inglaterra.

70.   A retomada da vitalidade urbana plena do Centro poderá também ser estimulada pela implantação da majoração gradual da cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de edificações subutilizadas, de prédios desocupados e de vazios urbanos. Esta medida é conhecida como IPTU progressivo e o Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios (PEUC), ambos previstos no Estatuto das Cidades (Lei n° 10.257, de 10 de julho de 2001). E são também recomendados por vários pesquisadores da conservação de áreas urbanas, sobretudo as afetadas por processos de esvaziamento semelhantes ao caso do Rio, conforme Urban Task Force (1999).

71.   A implantação da polifuncionalidade e a retomada da vitalidade urbana do Centro precisam ainda de incentivos fiscais e de financiamentos públicos e/ou privados diversificados com acessos facilitados para todas as camadas sociais, especialmente as intermediárias e baixas, conforme previsto nas Recomendações de Nairobi (CURY, 2000). A experiência da revitalização de The Merchant City em Glasgow, Reino Unido, na década de 1980, exemplifica com relativo sucesso a conjugação de financiamentos para perfis sociais com faixas salariais distintas garantindo desta forma a heterogeneidade social da população local. A totalidade do empreendimento foi premiada em 1988 pela Europa Nostra, organização de destaque no cenário da conservação do patrimônio cultural europeu (HEALEY, 1992).

72.   Os critérios de conservação do conjunto arquitetônico protegido ainda passível de detalhamentos se enquadrariam em categorias e subcategorias de graus de proteção, do mais restritivo (integral) até a renovação urbana (modificações extensas, demolições e/ou novas construções). Essa classificação se fundamentará nos diferentes patamares de preservação das características originais das composições arquitetônicas que englobam fachadas, interiores, cobertura e/ou áreas externas. Por conta disso, será importante também rever os critérios “fachadistas” e “coberturistas” dos decretos das APACs vigentes. Códigos de obras específicos, destinados a cada tipologia arquitetônica protegida, complementarão essa revisão. Para isso, é importante o estabelecimento de parcerias entra os órgãos de tutela do patrimônio cultural (IPHAN, INEPAC e IRPH) e os de licenciamento das Secretarias de Urbanismo e de Obras da Prefeitura do Rio. Ainda do ponto de vista físico, recomenda-se a padronização do mobiliário urbano, por meio de soluções que conciliem contemporaneidade com tradição, sem o emprego de simulacros (pastiches), uma vez que pouco sobrou de exemplares originais (postes, luminárias, bueiros, frades etc.). Todo esse trabalho se respaldará em pesquisas adicionais, conforme feitas pelo antigo Escritório Técnico do Corredor Cultural e pelo Departamento Geral de Patrimônio Cultural, atual IRPH, nas investigações de Pedro Alcântara (1981) e Dora Alcântara (1984) e das histórias dos bairros das APACs, respectivamente. É de grande importância a publicação deste material, de panfletos e manuais (ou similares, feitos pelos órgãos citados) para a educação patrimonial de usuários e técnicos envolvidos na conservação.

73.   Os impactos do fachadismo/coberturismo preconizados no Brasil, especialmente pelo Corredor Cultural do Rio de Janeiro, aplicados também nos critérios de conservação de APACs análogas da cidade e do esvaziamento do Centro do Rio já foram objeto de discussão na literatura da Conservação. Porém, a compreensão do comprometimento da autenticidade e da integridade dos sistemas construtivos tradicionais dos sobrados ainda necessita de análise detalhada, a partir, por exemplo, do estudo dos manuais de ofício, especialmente da Biblioteca de Instrução Profissional, citados anteriormente [Figura 11].

74.   Os referidos padrões construtivos são importantes para a compreensão das peculiaridades do patrimônio cultural do país, que vão além das dimensões artísticas e históricas. Reforçam outra recente variável dos instrumentos e das políticas de proteção e de conservação: as esferas científicas e tecnológicas que se entrelaçam, na realidade, com as duas referências tradicionais, quando viabilizam concepções estilísticas e refletem o estado da arte dos conhecimentos de cada época, que são socialmente construídos, conforme reafirmado na Carta de Petrópolis.

75.   A partir de trabalhos já referenciados e, principalmente, de relatos de profissionais correlacionados com a conservação dessas edificações, os interiores e sistemas construtivos preservados são minoritários no universo dos sobrados protegidos; porém, ainda existentes e com potencial de proteção. A maioria se transformou em pavimentos corridos, antes e depois da criação das APACs, especialmente em função da aplicação do critério fachadista, que admite a total renovação dos interiores, independentemente do grau de caracterização, isto é, da remanescência de elementos arquitetônicos, sistemas construtivos tradicionais e/ou compartimentações originais. Percebe-se, por exemplo, trocas de esquadrias, remoções de balcões, ornamentações, cantarias, inserções de marquises, instalação de aparelhos de ar-condicionado etc., que ocorreram antes da proteção; enquanto nas coberturas eram comuns substituições de entelhamentos, da morfologia das águas, retiradas de claraboias, entre outras. Tudo isso argumentado por conta de custos de manutenção e/ou predileção por padrões estilísticos e construtivos contemporâneos. Em toda a extensão das edificações (fachadas, coberturas e interiores), nota-se, ainda, a desconsideração do uso prioritário das técnicas construtivas originais, contrariando a recomendação da literatura especializada de Conservação.

76.   A opção secundária pela valorização de técnicas construtivas originais e, principalmente, a descaracterização, em larga escala, dos interiores comprometem a integridade e autenticidade desses bens culturais - deles e dos demais casos espalhados no Brasil e no exterior, que optaram pela proteção categoricamente restrita de fachadas e de coberturas, conforme evidenciado por Jonathan Richards (1994). Destaca-se, desta forma, a perda quantitativa e qualitativa de informações valiosas sobre antigas formas de se viver e de tecnologias ainda predominantemente úteis da época da construção dessas edificações. No primeiro caso, ainda se pode localizar dados relevantes em projetos originais e/ou modificações disponíveis nos arquivos da cidade, notadamente no Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro e na Companhia Estadual de Água e Esgoto (CEDAE). Essa documentação, porém, encontra-se na forma de anteprojetos, os quais disponibilizam informações pouco detalhadas dos processos construtivos empregados.

77.   Portanto, torna-se urgente a realização de um inventário do conjunto arquitetônico objeto de proteção da presente proposta, com especial atenção aos interiores ainda íntegros e, provavelmente, vulneráveis. Por meio dos casos remanescentes, seria possível aprofundar os estudos dos sistemas construtivos utilizados. Propõe-se, além disso, a complementação desta pesquisa a partir da investigação do papel dos valiosos acervos de fontes primárias dos manuais de ofícios, especialmente da Biblioteca de Instrução Profissional, conforme recomendado anteriormente [Figura 12]. Esse conjunto de informações busca subsidiar propostas de proteções adicionais pertinentes, a criação de critérios de conservação complementares aos já existentes e o aperfeiçoamento da literatura especializada de Tecnologia da Conservação.

78.   Os resultados alcançados nas propostas devem ir além dos domínios dos órgãos de patrimônio cultural, visando também à conscientização e à utilização, quando possível, deste “saber fazer” na qualificação e nos exercícios profissionais da mão de obra na construção civil. E isso sem deixar de considerar, ainda, o aprimoramento das ações dos usuários das edificações no cotidiano da sua conservação.

79.   Não se deve perder de vista, igualmente, a consideração dos aspectos que compõem a dimensão do patrimônio imaterial que se manifesta no perímetro do Centro do Rio. O local é repleto de instituições tradicionais, onde se manifestam a diversidade da vida cotidiana da cidade, do estado e do país, em uma integração emblemática entre passado e presente. Estabelecimentos culturais (Theatro Municipal e Real Gabinete Português de Leitura), comerciais (Confeitaria Colombo e Bar Luiz), políticos (Câmara Municipal e Assembleia Legislativa Estadual), religiosos (Mosteiro de São Bento e Federação Espírita Brasileira), representações de classe (Associação Brasileira de Imprensa), entre diversas outras, ainda preservam a dinâmica urbana local. Entre esses prédios e os usos tradicionais circulam festas populares (carnaval), rituais religiosos (procissões e cultos afro), manifestações políticas (comícios e passeatas) e outras atividades que reforçam a proposta de tombamento em questão e devem ser valorizadas nas estratégias de conservação. Flavio Villaça (1998) destaca que a presença desse legado diferencia o Centro do Rio das demais partes centrais metropolitanas do país em termos de vitalidade urbana, apesar do esvaziamento apontado anteriormente.

80.   A partir da implantação da legislação municipal de proteção do patrimônio imaterial, em 2003, a prefeitura já registrou diversos bens que possuem correlações diretas e indiretas com o Centro do Rio, no trecho do tombamento proposto. Muitos desses bens possuem reputação nacional, como são os casos da obra musical de Pixinguinha (Decreto n° 25.271, de 19 de abril de 2005), da obra literária de Machado de Assis (Decreto n° 29.902, de 26 de setembro de 2008), do gênero musical do Choro (Decreto n° 35.550, de 3 de maio de 2012), das Marchinhas de Carnaval (Decreto n° 39.751, de 5 de fevereiro de 2015), entre outros. No âmbito local, destacam-se o Cordão do Bola Preta, as figuras carnavalescas dos Clovis (Bate-Bolas) e a procissão de São Sebastião. Em 2012, a prefeitura registrou, por intermédio do Decreto nº 34.869, diversos bares e botequins da cidade, vários deles situados no Centro: Bar Luiz (1887), Nova Capela (1903), Casa Paladino (1906), Bar Brasil (1907), Armazém do Senado (1907), entre outros. Posteriormente, em 2017, a prefeitura também registrou, por meio do Decreto nº 43.914, 23 estabelecimentos tradicionais (lojas, chapelaria, charutaria etc.) distribuídos pelo Centro. A maioria desses bens culturais encontra-se, majoritariamente, sediados nos sobrados protegidos das APACs, construídos na ocasião da Reforma Passos, que se constitui no objeto de especial valorização da proposta de tombamento em questão.

81.   Após a transformação do Centro do Rio em patrimônio nacional, propõe-se sua inclusão no perímetro da área listada pela Unesco como Patrimônio Mundial, na categoria da paisagem cultural. A autenticidade e a integridade notáveis dos aspectos materiais e imateriais destacados ao longo da proposição do tombamento em evidência enquadram-se nos parâmetros estabelecidos pela Portaria nº 127 do IPHAN, pelo Plano Diretor da Cidade e, especialmente, pelo Guia Operacional da Unesco, de 2008, que, atualmente, embasa a Convenção de Patrimônio Cultural da Humanidade. A incorporação do Centro do Rio na área protegida ou, no mínimo, na zona de amortecimento, ampliaria a diversidade cultural desse patrimônio mundial, que se compõe, predominantemente, nos aspectos culturais, por manifestações modernistas, como o Aterro, o Parque do Flamengo e os mosaicos de pedra portuguesa de Burle Marx, na Praia de Copacabana. A recente demolição do Viaduto da Perimetral, que rompia a relação da orla da Baía de Guanabara com o interior do Centro, reforça a atual proposta. Portanto, o reconhecimento do Centro do Rio como bem cultural mundial contribuiria, da mesma forma, para relativizar o critério de excepcionalidade adotado pela Unesco neste caso. Observa-se, ainda, a persistência desta tendência na aplicação do conceito de paisagem cultural, que vem sendo aprimorado desde 1992 com o objetivo de tonar o universo de bens tutelados pela Unesco mais representativo da diversidade cultural e/ou natural mundial.

82.   Convém destacar, ainda, conforme já mencionado, que o Palácio Gustavo Capanema, marco da Arquitetura Moderna no cenário internacional, tombado pelo IPHAN, em 1948, situado no Centro do Rio, faz parte da lista indicativa do patrimônio mundial.

83.   O “Rio de Janeiro, paisagens cariocas entre a montanha e o mar” [Figura 13] já conta com um Plano de Gestão de 2014, que incorpora os parâmetros de conservação apresentados ao longo da parte inicial deste trabalho. Recomenda-se estendê-lo ao perímetro da proposta de tombamento do Centro. Em ambos os casos, as estratégias de conservação devem ser implantadas gradativamente e inseridas no modelo de desenvolvimento da cidade e do país, evitando-se, desta forma, os equívocos de experiências grandiosas que não se sustentaram posteriormente (PCH e Monumenta). Deve, mesmo, contemplar, democraticamente, os grupos sociais locais, os usuários da área em primeira instância, poder público e iniciativa privada, nos moldes do conceito de patrimônio cultural como indutor de desenvolvimento, conforme as recomendações da Assembleia Geral do Icomos, de Paris, de 2011.

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